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domingo, 5 de maio de 2019

Consciência coletiva: todos temos uma para viver.

 Em uma sociedade em que os casos de feminicídio aumentaram em mais de 70%  no primeiro trimestre desse ano em relação ao mesmo período do ano passado, em que uma advogada tem seu acesso ao plenário do Tribunal de Justiça de Rondônia barrado, por estar utilizando uma "roupa inadequada", ensinar os meninos a 'levar flores e a abrir a porta' para as meninas não vai trazer nenhum resultado que realmente impacte positivamente na diminuição desses fatos. O corte de verbas para universidades federais e, principalmente,  para cursos de filosofia e sociologia, certamente também não contribuirão para essa redução.

 Dentro de uma mentalidade patriarcal que circunda todo corpo social brasileiro, a força do coletivo condiciona o agir social e as formas de conduta assumidas. De acordo com Durkheim, a sociedade se organiza objetivando manter a harmonia, para evitar a anomia, o declínio de qualquer forma de controle, ela se organiza para manter seu funcionamento, para sobreviver. O papel assumido por cada um passa a possuir importância para manutenção desse funcionalismo. Mesmo que tais obrigações ocasionem a infelicidade individual, os indivíduos são subjugados a elas, as tendências comuns tendem a superar as individuais. A mulher, inserida num contexto social, no qual o machismo impera, é submetida a toda espécie de julgamentos caso se "desvie" das tendências coletivas atribuídas à sua figura.

 Quando a consciência coletiva dessa sociedade machista  é ferida, seja com uma "roupa inadequada", ou a recusa de se submeter à violência doméstica, ou com um pedido de divórcio , um direito, que ultrapassa o domínio das ciências e da técnica e passa a ser imanente a todas as consciências, baseado em perspectivas morais e religiosas, invoca o seu caráter punitivo, e o que, segundo Durkheim, era característica das sociedades pré-modernas, supera os limites do tempo e começa  a vitimar dezenas de mulheres cotidianamente. O que foi denominado por Durkheim como solidariedade mecânica, na qual a sociedade era regida por um ente superior, por uma vontade transcendente, em que havia o predomínio de um direito punitivo, com demonstrações públicas de punição, muitas vezes até mesmo com a morte, não ficou preso ao passado. Quantas são as mulheres que, diariamente, pagam com a própria vida o preço por "descumprirem" o fardo de regras que são, desde o seu nascimento, forçadas a suportar.

 Se há dúvidas a respeito da responsabilidade de disciplinas como a filosofia e a sociologia serem as grandes promotoras de balbúrdia, por outro lado, não existe questionamentos sobre o importante papel que elas assumem ao possuir o poder de promover esclarecimentos acerca das verdades genéricas introduzidas involuntariamente na consciência coletiva. E se não existe um indivíduo que esteja imune à força coercitiva e modeladora exercida pela sociedade, evidencia-se, dentro desse quadro, que tais matérias representam uma válvula de escape contra esta ingerência. O ataque gratuito a elas, portanto, apresenta-se como uma agressão ideológica à possibilidade de vencermos as amarras que submetem as mulheres a todo este conjunto de regras pré-determinadas e a toda violência por ele gerada.

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