A priori, todos esses fatores mais os valores morais e religiosos constituem-se como interferência na tomada de decisão de interromper uma gravidez desse tipo, sendo este um exemplo da crítica de Bourdieu a Kelsen em tentar formular um Direito livre de interferências: "reivindicação da autonomia absoluta do pensamento e ação jurídicos(...), completamente independente dos constrangimentos e das pressões sociais, tendo nele mesmo o seu próprio fundamento". Tal concepção torna-se difícil a partir do momento em que os costumes assumiram parte da interpretação do Direito, dessa forma, o aborto em sua generalidade é revestido de polêmica pois a moral religiosa, que vigorou por muito tempo na mentalidade humana, condena essa prática mesmo que em sua especificidade. Nesse sentido, entende-se essa conceituação como habitus, as disposições sociais incorporadas.
Ademais, vale-se atentar para outra conceituação que Bourdieu traz em sua análise, o poder simbólico, poder subordinado, é uma forma transformada, irreconhecível, transfigurada e legitimada, das outras formas de poder. Sendo a privação da escolha do aborto de um feto anencéfalo exemplo disso. Outrossim, deve-se levar em consideração o psicológico e a saúde das mães que enfrentam essa gestação de risco, além do perigo de vida que ela mesma corre, ter a certeza de que o feto, o qual ela carrega e tanto espera não se constituirá, no final uma vida, causa um sofrimento muito maior.
Entende-se, portanto, que o próprio Direito constitui-se o espaço dos possíveis que Bourdieu propõe. É o campo jurídico que deve fornecer meios e soluções para que as vontades sociais sejam concretizadas de acordo, é claro, com a legalidade, a fim de focar na utilidade prática e não conceitual do Direito.
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