Segundo Jessé
Torres Pereira Júnior, “Diante das expectativas que as Constituições
contemporâneas despertam nas sociedades e dos valores por estas reconhecidos, os juízes e tribunais devem estar qualificados para aplicar o direito segundo regras de moralidade, seja nas convenções entre particulares ou nas relações públicas."
Neste contexto que podemos
iniciar a relação dos conceitos de Bourdieu. O direito, para o sociólogo, tira
a linguagem em que os conflitos se expressam nas estruturas de poder internas,
mas isso só é possível através de um espaço legitimador, que garante o apoio
popular e a confiança no sistema jurídico.
Apesar de regular as
dissensões, não cabe ao Estado estatuir questões relacionadas à ética privada e
à intimidade. O direito de escolha da mulher seria um ato de
proteção e solidariedade à sua dor e ao seu sofrimento, portanto deve ser
assegurado.
Denominado espaço dos
possíveis, têm suas fronteiras pautadas em dois extremos: a moral, que é
mutável, por isso varia com o tempo e época; e a ciência, que apesar de
maleável, apresenta uma estrutura mais rígida em contexto cambiante. Inserido
nestes confins também podemos encontrar constituições, jurisprudências e
doutrinas.
Dr.
Jorge Andalaft Neto, representante da Federação Brasileira das Associações de
Ginecologia e Obstetrícia, apontou que as mulheres gestantes de feto anencefálico
apresentam maiores variações do líquido amniótico, hipertensão e diabetes,
durante a gestação, bem como aumento das complicações no parto e no pós-parto e
consequências psicológicas severas, com oito vezes mais risco de depressão.
Estas moléstias que trazem a legalização do aborto de anencefálicos para dentro
do “espaço dos possíveis”, pois o risco de vida e de saúde da gestante, também
são questões validadas na moral atual, e consequentemente, no direito.
O direito, com autonomia
relativa, e sua estruturação do campo e das decisões, busca um quimérico em bem
universal e equitativo. Estes, representados pela neutralidade e
universalidade. A primeira, visando garantir princípios e instituir uma justiça
igualitária, já a última, buscando fundamentos ecumênicos, que nem sempre são
bons, vez que casos concretos são únicos e privativos.
A equanimidade tratada no parágrafo anterior, põe-se presente
no voto do Ministro Marco Aurélio, quando este diz que “As concepções morais
religiosas, quer unânimes, quer majoritárias, quer minoritárias, não podem
guiar as decisões estatais, devendo ficar circunscritas à esfera privada.”
Ante o exposto, pode-se
concluir então, que após travestir-se de neutralidade e universalidade, legitimar
e ratificar-se com o habitus e determinar
um “espaço dos possíveis”, o direito, determinante de conduta, mascara seus
aplicadores e sanciona decisões que podem ser errôneas ou até oportunistas.
Estas, por sua vez, negando a condição de ação de um terceiro institui a violência
simbólica.
“O campo jurídico é o embate
permanente pelo direito de dizer o direito”. Na ADPF 54, a imposição do poder, através de uma moral religiosa
específica, muitas vezes caracterizada erroneamente como laica, ocasiona em
danos psicológicos às mulheres que sofrem com casos concretos.
Por fim, insta mencionar,
que há uma busca incessante dos magistrados em abandonar a historicização da
norma, o célebre “pôr-em-forma”. Isto se concretiza em uma adaptação ao real, e
vinculação mor aos princípios éticos.
A ação traz à tona um de
diversos assuntos que ressaltam o conflito “letra da lei/espírito da lei”, que
dotado de valor moral, pode resultar em decisões nocivas aos direitos
fundamentais. E por isso faz-se imprescindível a adequação correlata com princípios
éticos equitativos, buscando uma harmonização cada vez maior de prolegômenos isonômicos.
Vinícius Moreno Gonzales - direito noturno - turma XXXV
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