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quarta-feira, 20 de junho de 2018

Máscara Legítima


Segundo Jessé Torres Pereira Júnior, “Diante das expectativas que as Constituições contemporâneas despertam nas sociedades e dos valores por estas reconhecidos, os juízes e tribunais devem estar qualificados para aplicar o direito segundo regras de moralidade, seja nas convenções entre particulares ou nas relações públicas."

Neste contexto que podemos iniciar a relação dos conceitos de Bourdieu. O direito, para o sociólogo, tira a linguagem em que os conflitos se expressam nas estruturas de poder internas, mas isso só é possível através de um espaço legitimador, que garante o apoio popular e a confiança no sistema jurídico.
Apesar de regular as dissensões, não cabe ao Estado estatuir questões relacionadas à ética privada e à intimidade. O direito de escolha da mulher seria um ato de proteção e solidariedade à sua dor e ao seu sofrimento, portanto deve ser assegurado.
Denominado espaço dos possíveis, têm suas fronteiras pautadas em dois extremos: a moral, que é mutável, por isso varia com o tempo e época; e a ciência, que apesar de maleável, apresenta uma estrutura mais rígida em contexto cambiante. Inserido nestes confins também podemos encontrar constituições, jurisprudências e doutrinas.
Dr. Jorge Andalaft Neto, representante da Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia, apontou que as mulheres gestantes de feto anencefálico apresentam maiores variações do líquido amniótico, hipertensão e diabetes, durante a gestação, bem como aumento das complicações no parto e no pós-parto e consequências psicológicas severas, com oito vezes mais risco de depressão. Estas moléstias que trazem a legalização do aborto de anencefálicos para dentro do “espaço dos possíveis”, pois o risco de vida e de saúde da gestante, também são questões validadas na moral atual, e consequentemente, no direito.
O direito, com autonomia relativa, e sua estruturação do campo e das decisões, busca um quimérico em bem universal e equitativo. Estes, representados pela neutralidade e universalidade. A primeira, visando garantir princípios e instituir uma justiça igualitária, já a última, buscando fundamentos ecumênicos, que nem sempre são bons, vez que casos concretos são únicos e privativos.
A equanimidade tratada no parágrafo anterior, põe-se presente no voto do Ministro Marco Aurélio, quando este diz que As concepções morais religiosas, quer unânimes, quer majoritárias, quer minoritárias, não podem guiar as decisões estatais, devendo ficar circunscritas à esfera privada.”
Ante o exposto, pode-se concluir então, que após travestir-se de neutralidade e universalidade, legitimar e ratificar-se com o habitus e determinar um “espaço dos possíveis”, o direito, determinante de conduta, mascara seus aplicadores e sanciona decisões que podem ser errôneas ou até oportunistas. Estas, por sua vez, negando a condição de ação de um terceiro institui a violência simbólica.
“O campo jurídico é o embate permanente pelo direito de dizer o direito”. Na ADPF 54, a imposição do poder, através de uma moral religiosa específica, muitas vezes caracterizada erroneamente como laica, ocasiona em danos psicológicos às mulheres que sofrem com casos concretos.
Por fim, insta mencionar, que há uma busca incessante dos magistrados em abandonar a historicização da norma, o célebre “pôr-em-forma”. Isto se concretiza em uma adaptação ao real, e vinculação mor aos princípios éticos.
A ação traz à tona um de diversos assuntos que ressaltam o conflito “letra da lei/espírito da lei”, que dotado de valor moral, pode resultar em decisões nocivas aos direitos fundamentais. E por isso faz-se imprescindível a adequação correlata com princípios éticos equitativos, buscando uma harmonização cada vez maior de prolegômenos isonômicos.

Vinícius Moreno Gonzales - direito noturno - turma XXXV

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