Ao longo do tempo o
colonialismo refletiu de diversas maneiras nas antigas colônias, a mais
proeminente foi na cultura. Os países que sofreram da colonização hoje
partilham da mesma língua de seus colonizadores, além de um pensamento extremamente
eurocêntrico. Tal visão fez com que os colonizados desvalorizassem suas produções
e saberes originais, em contramão valorizando o que é estrangeiro. Com o advento
do imperialismo estadunidense e a consolidação do “american way of life”, é visível a desvalorização e o sufocamento
dos entendimentos locais, perante a suposta superioridade do norte.
Contudo, as diferenças entre
o norte e o sul persistem, e vêm sendo ignoradas em nome de uma hipossuficiência,
mas este colonialismo do norte produz uma serie de exclusões, principalmente no
âmbito jurídico. Isto é visto no primado do direito, uma forma de legitimação da
exploração do sul e uma expressão do imperialismo. A linguagem jurídica moderna
valida o modelo dominante, colonial e capitalista, esquecendo-se das diferenças
abissais entre norte e sul, mas vendendo a realidade do norte como uma verdade
global.
Assim, o direito
instrumentaliza-se tal qual um reflexo dos interesses dos capitais do norte, a
partir de uma perspectiva universal e global. Um dos maiores exemplos disso é
os direitos humanos, criado a partir de somente uma perspectiva e excluindo
toda uma complexidade de encontros jurídicos, e, além disso, não reconhecendo a
linha abissal que divide o mundo.
A partir disso, Boaventura
de Sousa Santos propõe uma epistemologia do sul, que junto com a sociologia do
direito identificaria as exclusões causadas pelo pensamento colonial,
reformulando e desconstruindo a partir do direito moderno, destarte á produzir
um direito emancipatório. Em conjunto, Sara Araújo propõe uma ecologia de
direitos, rejeitando a monocultura estabelecida pelo norte e reconhecida à
multiplicidade de conhecimentos do sul, e á partir da vivencia do habitus jurídico alargar o cânone jurídico
e promover um direitos dos oprimidos.
O dito acima é uma descrição
do que ocorreu no agravo de instrumento referente ao caso da Fazenda Primavera
do MST, ocorrido no Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul em 2001. No qual
uma reintegração de posse colocou em conflito os interesses coletivos e os
individuais, e contrapôs o recente conceito de função social da terra com o já
estabelecido, e universal direito á propriedade. Este evento reconheceu que o
latifúndio não deve ser resguardado, pois desafia o equilíbrio social e não possuía
função social, e declara que o direito á propriedade não é absoluto, e que
assegurar uma vida digna é um dever fundamental do estado.
No ano seguinte ao evento, o
Código Civil de 2002 traz no art 1.228 a asseguração do direito á propriedade,
mas em seu caput o vincula as finalidades econômicas e sociais; assegurando
assim a tutela constitucional da função social da propriedade. Assim, gerando
uma ecologia jurídica, que não ignora o legado colonial/ imperialista, mas
reconhece e identifica as exclusões causadas por ela, tal qual o movimento antropofágico
da década de 20; e assim faz prevalecer uma diferença que cria uma sociedade
mais igualitária e coloca o direito em um espaço de transformação e
diversidade.
Mariana Santos Alves de Lima - Noturno
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