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segunda-feira, 27 de novembro de 2017

Não menosprezemos o "meio-termo"





Grande parte do cenário atual de lutas – também de passadas – gira em torno da mobilização do direito devido à falta de espaço na arena política, pelos movimentos sociais; caso essa, acompanhado por vezes, da demanda inversa de tais grupos, ganhando espaço no campo político; no sentido da redução de alguns direitos e liberdades em função da extrema regulação.
Tal extremismo na regulação é ilustrado pela posição estatal interventora no sentido do nascimento, tecendo determinações que nem sempre levam em conta o que realmente se entende como maior bem a ser preservado – a vida.
Mais do que nunca, faz-se necessário desenvolver um equilíbrio no capital de cada luta simbólica, no sentido de não tender exclusivamente à autonomia absoluta do pensamento e ação jurídicos, conforme visão kelseniana; mas há de se considerar que o próprio pensamento jurídico não se basta, sua formação e, principalmente, aplicação, sofrem influência direta do meio social no qual estão imersos, caso contrário a Constituição nada mais é que um ente figurativo.
Em contrapartida, faz-se difícil uma roupagem exclusivamente ideológica para questões como o próprio aborto de anencéfalos, uma vez que o leque se abre para concepções radicais tanto politicamente falando, quanto no aspecto cultural e religioso. Nesse sentido, não se pode ignorar o habitus referente a cada qual, as disposições incorporadas pelos indivíduos em sua formação ou em campos nos quais passaram a fazer parte. Tal aspecto é forte – não determinante, talvez condicionador — elemento na tomada de partidos em decisões; contudo, não único fator.
O fato do habitus,apregoado por Bourdieu, não ser final e inegável em si pode ser observado em decisões do STF – não todas são tão despidas de tal –, cujo próprio equilíbrio decisivamente permeia o campo jurídico majoritariamente, utilizando-se de seus elementos, linguajar, argumentação, apuração e análise; tecendo uma narrativa cujos escritos legitimam seu próprio campo (doutrina, jurisprudência,...). Assim, estruturam-se as decisões na estrutura jurídica. Contudo, não deve haver um abandono do campo experimental, uma vez que a ignorância de tal capital fadaria a inaplicabilidade do direito, sua ineficácia ou até invalidade. 
Sendo assim, levemos em conta a lógica do campo jurídico como duplamente determinada, considerando as forças específicas que o orientam e sua necessária coexistência. Casos como a descriminalização do aborto de anencéfalos, pelo STF, é exemplo do espaço dos possíveis no campo jurídico, no sentido de contrariar a perspectiva de Luhmann ao encarar o direito como ente autopoiético que faz-se por si só, com sua própria lógica. Se assim o fosse, seguiriam-se estritamente as disposições constitucionais erguidas em defesa dos "pró-vida"; mas, toda a tensão social e emocional envolvida nos casos seria negligenciada, fato esse criticado pelo próprio Bourdieu ao exigir resposta do direito a tais demandas.
O extremismo sempre se faz temeroso a qualquer que seja o campo. Assim, o equilíbrio entre o jurídico e a própria ideologia é condição primordial para a homeostase do corpo social, trazida justamente pela construção e desconstrução resultantes dos capitais simbólicos de cada campo, a contribuir a sua maneira para lucidez que caminha entre o instrumentalismo e o formalismo.


Rúbia Braganca Pimenta Arouca

1º ano Direito diurno

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