A problemática da descriminalização do aborto de anencéfalos enfrenta, no Brasil, barreiras sólidas, culturalmente construídas.
Há, aqui, a esse respeito, uma representação política formada por classes dominantes, defensora dos objetivos das mesmas e baseada em princípios religiosos. Infelizmente, são pessoas dessa representação que discutem sobre o tema em questão e outros que envolvem problemáticas sociais. Tais representantes, mesmo sendo pautados pela laicidade do Estado, têm essa atitude e fazem com que a população careça de um respaldo político e jurídico para lidar com as ausências do Estado em suas vidas.
Em relação à criminalização do aborto de anencéfalos, vê-se que o Estado, ao proibir tal atitude, se faz mais uma vez ausente quando não apoia uma mãe que sofre com uma gravidez sem futuro e com o fato de que seu feto já esteja em sofrimento, mesmo antes de nascer. Como isso talvez se mostre subjetivo aos olhos da classe dominante que governa o país e que administra o ordenamento jurídico, dizendo ser pró-vida, o argumento de que milhares de mães morrem ao tentarem fazer um aborto caseiro - e isso não se limita apenas aos casos de anencéfalos - talvez se mostre mais real.
Dessa forma, vê-se que essa classe dominante luta para que seus princípios sejam mantidos ou colocados em prática no corpo social, por não cumprirem com a sua obrigação de representatividade em sua essência, contando com a laicidade de suas decisões. Tendo o que Pierre Bourdieu coloca em sua obra, essa atitude pode ser considerada como uma violência simbólica e, para que ela seja atenuada, é necessário que o Direito, por ser responsável pela legalidade desse tipo de aborto, esteja em conformidade com o formalismo, para que os interesses dessa classe dominante, estando ela no poder político e judiciário ou não, não se sobreponha ao interesse comum, tutelado obrigatoriamente pelo Direito.
Dessa forma, mesmo com essas barreiras, a ADPF 54, que descriminalizou o aborto de anencéfalos, demonstra esse caminho à conformação e é apenas um passo para que a luta pelo aborto necessitado por outras motivações seja também descriminalizado e legalizado.
Vivian Facioli H. Mello - 1º ano noturno
Nenhum comentário:
Postar um comentário