De nada adianta se o Direito apenas pairar sobre o plano
social, como um sistema autônomo. Seu objetivo não era o de regular as relações
sociais? Ele tem que ouvir os clamores da multidão. Os engravatados devem
descer de seu pedestal divino para ouvirem os outros, principalmente os que
pertencem a um grupo diferente do que eles.
Porém, parece que pedir que a mulher tenha uma voz efetiva
na sociedade, em pleno século XXI, é demais.
A descriminalização do aborto de anencéfalos é uma conquista
a se comemorar; mas apenas um pequeno degrau de uma escada muito grande, e que já
estamos ameaçando de descê-lo com a PEC 181, que por uma manobra de um jogo de
palavras passaria a proibir o aborto em todos os casos.
É impossível não sentir raiva de todos aqueles deputados da
bancada Evangélica comemorando a PEC 181. É horrível e frustrante ter que seguir
leis feitas por homens e que versam sobre nossos corpos. Eles não sabem, nunca
saberão.
Eles veem tanta vida no feto e tão pouca na mãe. Não se
importam com as milhares de mulheres que morrem todo ano por não possuírem o
direito de escolha, e por não terem acesso a condições minimamente humanas e
dignas para levarem sua escolha a diante. As ricas sobrevivem, as pobres já não
possuem tanta sorte.
Dá vontade de gritar que mulheres não são simplesmente “encubadoras”
da sociedade. Sobre o quanto que a gravidez é romantizada, tanto o processo de
nove meses quanto o que ela, em tese, significa: o suposto ápice da vida de uma
mulher.
Eu queria falar sobre agulhas de crochê e chás de canela. Sobre
como métodos contraceptivos são quase sempre direcionados para as mulheres e
não para os homens. Como o anticoncepcional tem efeitos horríveis e ainda é
esperado que as mulheres se submetam a ele.
Eu queria falar sobre como a responsabilidade da criação de
um filho cai quase que 100% sobre os ombros da mãe. Sobre como um pai que troca
fraldas e posta no Facebook é louvado e ovacionado como “paizão do ano”, e uma
mãe que faz o mesmo apenas está fazendo o seu trabalho.
Eu queria lembrá-los da quantidade absurda de mães solteiras
e de filhos que não possuem sequer o nome do pai em seus documentos. Sobre a
condenação do prazer feminino, a repreensão da sexualidade das mulheres. Sobre
como a sociedade quer para si o domínio sobre os corpos femininos.
“Na hora de fazer tava gostoso, né?”
Eu queria falar tudo isso, mas não seria ouvida. Aparentemente
as vozes das mulheres não chegam ao Olimpo dos engravatados que decidem sobre
suas vidas (ou mortes).
Lara Estrela Balbo Silva - 1º ano Direito Noturno
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