Pierre
Bourdieu trata de alguns conceitos que podem ser relacionados ao campo
jurídico. Começando pelo próprio conceito de Campo para o sociólogo, o qual
seria um espaço constituído por autonomia de valores, códigos de linguagem e
“habitus” (valores trazidos pelos
atores que habitam o campo jurídico) específicos, possuindo
recursos específicos (recursos institucionais, pessoais, por exemplo, a
linguagem jurídica), capital simbólico (recursos que você possui e que, numa
dinâmica de concorrência permanente, você consegue alguma distinção dentro da
sociedade por possuir este capital simbólico). Para Bourdieu, esses elementos são inerentes a vida social em cada campo
específico, os quais trazem certa autonomia para cada espaço.
A ciência rigorosa do Direito, que o toma como
objeto de estudo, deve evitar o instrumentalismo (ideia de Direito a serviço da
classe dominante), assim como o formalismo (entendimento do Direito como força
autônoma diante das pressões sociais).
Essa ideia de Bourdieu o leva a fazer uma crítica a Kelsen, dizendo que o
direito não é a autonomia absoluta do pensamento da ação jurídica. As pessoas
trazem seus habitus externo (correlação de forças externas) ao campo jurídico
no momento de aplicação e utilização do Direito. Para Kelsen, este campo é
fechado, não sofre outras influências que não as relacionadas ao campo
jurídico.
O direito retira das estruturas de
poder internas a linguagem na qual seus conflitos se expressam, todavia, não é
esse o princípio de sua transformação: o direito retira da sua linguagem
própria aquilo que remete a transformação. Exemplo: mudança do aspecto legal do aborto: retira da
linguagem sua lógica interna, o que acontece de fora oferece, pelo menos, um
impacto mínimo a essa mudança; a linguagem que põe em prática a transformação
vem do campo jurídico, no entanto, essa transformação é externa a esse campo. Ilusão de independência do Direito em face das
relações de forças externas: Corpus jurídico expressa o estado destas
relações. A dinâmica do direito
engendra a “lógica positiva da ciência” (aquilo que representa a razão -
lógica) e a “lógica normativa da moral” (influências externas; o que é justo -
ética), reguladas estruturalmente na concorrência no âmbito desse campo. O Direito
deve ser enxergado pela sociedade como algo universal. Os limites às
interpretações no âmbito do
campo jurídico estão condicionados pela própria definição do “espaço dos
possíveis”, o qual encontra-se no território entre a razão e a moral, local
onde se perpetuam os conflitos. A própria hierarquia do campo inibe divergências profundas, e a
interpretação se dá de uma forma regulada no campo jurídico e não de uma forma
de quebra de paradigmas. O Ethos (visões de mundo compartilhadas) compartilhados explicam a expressão dos
valores dominantes no âmbito do campo. Por isso, para Bourdieu, a pouca probabilidade de desfavorecimento dos
dominantes. Aquilo que se traz de fora deve ser interpretado pelo campo, deve
ser aceito, devem existir lutas simbólicas dentro do campo jurídico, mas sem
abandonar o seu habitus, tais lutas não vão contra o direito, vão contra
determinada posição dentro do direito.
No que diz respeito a ADPF/54, a qual trata da questão do aborto de fetos anencéfalos, é possível estabelecer relações com as teorias de Bourdieu. É possível dizer que há, neste caso prático proporcionado pela ADPF, uma confusão entre as funções de doutrinador e operador do direito. Relacionando com o fenômeno da judicialização, sobre o qual trata Barroso, quando o Legislativo não se manifesta, é necessário que o Judiciário avance sobre determinados anseios sociais, de modo que, como no caso apresentado, os ministros do STF não só adequaram uma norma à realidade, mas sim criaram uma nova norma. Vivemos, até hoje, em uma sociedade patriarcal, a qual trata o aborto de fetos anencefálicos – e o aborto de modo geral – dentro do espaço dos possíveis sobre o qual discorre Bourdieu, restringindo esta decisão a uma minoria que domina o poder. A decisão da ADPF/54 de aprovar o aborto em caso de fetos anéncefalos demonstra que o direito pode – e deve – se adaptar de acordo com as mudanças e reivindicações sociais. O direito, como evidencia Bourdieu, deve se constituir de um fato da realidade, sendo um reflexo da sociedade na qual está inserido. Ainda há muito a ser feito para que haja uma expansão do espaço dos possíveis e, assim, existir um direito verdadeiramente universalizante.
No que diz respeito a ADPF/54, a qual trata da questão do aborto de fetos anencéfalos, é possível estabelecer relações com as teorias de Bourdieu. É possível dizer que há, neste caso prático proporcionado pela ADPF, uma confusão entre as funções de doutrinador e operador do direito. Relacionando com o fenômeno da judicialização, sobre o qual trata Barroso, quando o Legislativo não se manifesta, é necessário que o Judiciário avance sobre determinados anseios sociais, de modo que, como no caso apresentado, os ministros do STF não só adequaram uma norma à realidade, mas sim criaram uma nova norma. Vivemos, até hoje, em uma sociedade patriarcal, a qual trata o aborto de fetos anencefálicos – e o aborto de modo geral – dentro do espaço dos possíveis sobre o qual discorre Bourdieu, restringindo esta decisão a uma minoria que domina o poder. A decisão da ADPF/54 de aprovar o aborto em caso de fetos anéncefalos demonstra que o direito pode – e deve – se adaptar de acordo com as mudanças e reivindicações sociais. O direito, como evidencia Bourdieu, deve se constituir de um fato da realidade, sendo um reflexo da sociedade na qual está inserido. Ainda há muito a ser feito para que haja uma expansão do espaço dos possíveis e, assim, existir um direito verdadeiramente universalizante.
Thais Amaral Fernandes
1º ano Direito diurno
Nenhum comentário:
Postar um comentário