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segunda-feira, 28 de outubro de 2019

Para os novos tempos de crise, os velhos tempos de exceção.


   País notável por sua distribuição de riqueza polarizada, ressoando os ecos de seu passado ditatorial e flertando com os jogos neoliberais, é um Estado que faz de sua nova economia o renascimento de velhos hábitos. Hoje, os países latino-americanos, em sua maioria passíveis de enquadramento na narrativa exposta acima, efervescem convulsões sociais marcadas pela adoção fiel dos pacotes de austeridade pressupostos pela mão invisível do invisível. Nem mesmo o mercado – consagrado pelo liberalismo econômico como a força reguladora – fez-se capaz de seguir ileso das missões autofágicas dos neoliberais.


   O capitalismo, em escala global, tornou-se alvo constante de suas próprias proposituras: de um lado, a segregação econômica que se faz imprescindível para a distinção de classes, e, do outro, o anseio pela justiça social fortemente disseminado pelo processo globalizatório. Mediante tal dicotomia, a possibilidade de harmonização tange ao inverossímil: para os novos tempos de crises, os novos tempos de exceção. Tal situação acentua-se quando tratamos de países “em processo de desenvolvimento”, dado que o progresso econômico é visionado a qualquer custo, fora uma incumbência genérica a nós determinada por aqueles (países) que já percorreram pelo almejado caminho do “sucesso”. 


   Em sua obra “A sociedade da austeridade e o direito do trabalho de exceção”, António Casimiro Ferreira discorre acerca do que o próprio chama de “forçosa racionalização das irracionalidades do capitalismo”, ou seja, em sua primeira oportunidade de supressão, o sistema flexibiliza as relações trabalhistas por meio de reformas laborais e promove uma erosão nos direitos de seus trabalhadores e suas trabalhadoras, a base de qualquer pirâmide produtiva. A priori, mostra-se como uma solução eficaz dado que confere liberdade aos contratantes – donos do poderio – no entanto, não é difícil alcançar o futuro próximo e analisá-lo como problemático: a base de seu modo de produção encontra-se sem nenhum amparo.


   Imerso em um caldo de naturalização de desigualdades, o Brasil percorre caminhos similares aos examinados por António Casimiro Ferreira em sua obra: Paulo Guedes, atual ministro da economia, acena para o Estado chileno, ansiando pela maximização de políticas neoliberais e nos assombrando com recordações de Pinochet. O Direito e a Justiça do Trabalho tornaram-se os novos vilões da nação brasileira. 


   Dentro desse contexto de precarização de nossas relações trabalhistas – vide Reforma Trabalhista, afrouxamento de restrições à terceirização, e encaminhamento da Reforma da Previdência – a declaração de procedência da ADPF 324 pelo STF denotou uma sequência ao afastamento do Estado de suas causas sociais, principalmente quando estas se põem como barreira à plena desregulamentação do mercado. Em suma, a concordância com o instrumento pela maioria dos ministros disponibilizou a terceirização irrestrita das atividades meio e fim às pessoas jurídicas. Em contrapartida, a Justiça do Trabalho mostrou-se avessa à nova interpretação, invocando a Súmula 331 do TST, bem como direitos humanos e do trabalho amparados por nossa Constituição Cidadã.


   A flexibilização extensa do trabalho, proposta tanto pela Reforma Trabalhista quanto pela terceirização, adotam a mão de obra humana como mera mercadoria. Remuneração média inferior, maior rotatividade de empregos, aumento de acidentes e mortes proporcionados por locais insalubres, além da pulverização da classe trabalhadora, são todos instrumentos utilizados para desvencilhar as redes que conectam o povo e suas lutas. 


   A América Latina fora, ao longo de sua história, bombardeada por interesses externos, vivências impositoras e uma desigualdade social bastante benéfica àqueles que almejavam nossos recursos. Quantas sonegações adicionais serão necessárias para que adotemos nosso cosmopolitismo, apoio e respeitos mútuos contra as forçosas imposições globais? O povo brasileiro, de maneira uníssona, ainda desconhece o que é viver sem as duras amarras da austeridade.

Vitória Garbelline Teloli - 1º Direito (noturno)

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