A percepção de que estamos engendrados
em um sistema que repele nossas vontades genuínas tem sido constatada cada vez
mais com o decorrer do tempo. Isso porque as vontades humanas são dominadas e
controladas para servir a um único propósito: favorecer àqueles que sempre
estiveram no topo da pirâmide social que existe desde o início dos tempos. A
mitigação das vontades e do livre arbítrio é o que cria a incompatibilidade de
pessoas e resulta em violências extremas que repelem a união social, causando
apenas guerras, tragédias ou qualquer coisa que se distancie do bem comum e
equânime, o que leva a compreensão de que para perpetuar a ideia de que todos
somos livres perante a jurisdição que nos garante livre arbítrio dentro dos
parâmetros legais de vivência social, é necessário validarmos a igualdade e o
bem estar em sociedade, a partir da compreensão do livre arbítrio individual
como uma construção também pessoal de cada ser humano que passa a se revelar
como sendo um papel cultural muito maior dentro das formas de história de cada um que grande parte da população invalidou durante muito tempo,
possivelmente durante até mesmo séculos. Entende-se que o papel do Estado usual é respeitar as
diferentes formas de vida, ao passo que, interfira quando o contrário não
estiver sucedendo, ou seja, é necessário ter em vista que o Estado não é
responsável por interferir nas diversas escolhas de dar continuidade a uma
vivência, porém é necessário que ele interfira enquanto um guardião e
assegurador dos direitos sociais quando essa liberdade for negada a um
indivíduo na sociedade.
No ADI 4.339 referente ao ensino
religioso nas escolas públicas é discutida a questão referente a laicidade do
Estado e o ensino religioso de matrícula facultativa. Em vista disso, a decisão
do STF foi de que esse ensino só pode ser realizado se abarcar as diversas
religiões existentes e não apenas se concentre em uma específica, pois isso irá ferir as premissas de livre arbítrio e liberdade religiosa. Além disso, os
ensinamentos deveriam se basear em formas didáticas de ensino para que se
afaste cada vez mais de um possível ideia de doutrinação religiosa.
Boaventura de Sousa Santos, em seu
artigo denominado “Direitos Humanos e o desafio
da interculturalidade”, descreve o que seria um Topoi: “lugares comuns
retóricos mais abrangentes de determinada cultura, que funcionam como premissas
de argumentação que, por sua evidência, não se discutem e tornam possíveis a
produção e a troca de argumentos.”, ou seja, em cada local existe um forma de
estruturação cultural que garante a hegemonia de determinado pensamento sobre
determinado território, e essa visão pode causar estranhamento e rivalidade
entre povos, o que Boaventura diz se tratar de um viés multiculturalista. O
multiculturalismo foi criado com o decorrer da globalização que necessitou que
houvesse o dominador e o dominado para suprir as necessidades do sistema.
Com o
multiculturalismo e a existência de topois, Santos discorre sobre como as
culturas possuem diversos sentidos, e que cada uma delas carrega consigo o que
existe no local de mais valioso. A partir de então, ele descreve a hermenêutica
diatópica: “baseia-se na idéia
de que os topoi de uma dada cultura, por mais forres que sejam, são tão
incompletos quanto a própria cultura a que pertencem. Tal incompletude não é
visível do interior dessa cultura, uma vez que a aspiração à totalidade induz a
que se tome a parte pelo todo. O objectivo da hermenêutica diatópica não é,
porém, atingir a completude — um objectivo inatingível — mas, pelo contrário,
ampliar ao máximo a consciência de incompletude mútua através de um diálogo que
se desenrola, por assim dizer, com um pé numa cultura e outro, noutra. Nisto
reside o seu caracter diatópico (SANTOS, 1997).
Dessa forma,
Boaventura define que para a vivência equânime que respeite e modele os
direitos humanos, é necessário que seja desenvolvida uma compreensão referente
a toda e qualquer cultura. Portanto, definir que o ensino religioso seja
facultativo e abrangente a todas as religiões é fundamental para que a
tolerância e o bom convívio possam aflorar cada vez mais na sociedade do século
XXI.
Beatriz Dias de Sousa, 1º ano
Direito Noturno
Nenhum comentário:
Postar um comentário