A
obra “Sociedade da Austeridade
e direito do trabalho de exceção”,
composta por António Casimiro Ferreira, aplica-se
a decupar o
instrumento basilar da política econômica neoliberal: a
austeridade. Elemento sintomático das crises financeiras que
assolaram as décadas antecedentes e
fiel escudeira das articulações privadas no século XXI,
o teor austero das agendas
governamentais transcende
a mera posição de modelo administrativo, convertendo-se
em um mecanismo híbrido – visto o vínculo Estado-capital,
subsidiário e promotor das estruturas de dominação social.
Nesse
ínterim, o autor concede enfoque essencial frente
ao aspecto psicológico
oculto às sombras do processo de desaparelhamento
estatal, e não carente de
motivo. Os preceitos estipulados pela Escola de Chicago, a título de
exemplo, compreendem momentos de fragilidade populacional como
oportunidades de alteração da conjuntura socioeconômica. Traumas,
medo, desesperança: esses são fatores capazes de tornar a psique
humana propensa às influências externas.
A transferência de culpa e
responsabilidade aos
indivíduos, designados como causa da onerosidade excessiva do Estado
e – consequentemente – do colapso econômico, portanto, não
apenas se torna viável diante de tragédias mercadológicas, como
tece um novo âmbito suscetível à
reestruturações sistêmicas.
Trata-se, sob a óptica de
Naomi Klein, de uma “doutrina de choque” à nível nacional ou,
pautando-se pelo panorama contemporâneo, global.
Isso
posto, a congregação multilateral
de dimensões desestabilizantes, aliadas aos componentes habituais de
perpetuação e permeabilização do regime hierárquico classista,
corroboram para revigorar os projetos de extinção dos auxílios e
garantias trabalhistas e sociais
– acobertados pela égide da justificativa empregatícia.
Com base nisso, instauram-se
formatos distintos de contingenciamento e corte de verbas públicas,
ao mesmo passo que propostas de flexibilização normativa se
concretizam, formulando um pretenso Estado disciplinado e rigoroso em
relação à
dispendiosidade. No entanto,
tamanho empreendimento para constituição de governos enxutos e
“eficazes” não se revela perante a política mercantil. O
intervencionismo bilionário realizado pela entidade estatal, ao
defrontar-se às falências do capital financeiro, revela a
contradição interna dos reais pontos motivacionais da mobilização
neoliberal.
Por
fim, analisando-se a
composição do cenário brasileiro, o Supremo Tribunal Federal, ao
declarar procedente a Arguição de Descumprimento de Preceito
Fundamental (ADPF) 324, fazendo-se
lícita a terceirização das relações trabalhistas, por
atividade-fim ou meio –
no setor privado, o guardião constitucional, incumbido de resguardar
os direitos previstos no código supremo, flerta e
se conecta ao discurso que preza pela preponderância da questão
monetária, em detrimento da dignidade da vida humana. A precarização
laboral, congruentemente à política de austeridade, surte efeitos
na esfera psicológica, e a insalubridade mental, decorrente do
desamparo e angústia relativa ao futuro, retroalimenta o ciclo de
fragilização da vida em sociedade. À
vista disso, a postura
adotada pela última instância judicial comprova,
inquestionavelmente, o caráter sintomático da austeridade como
suposta solução às ingerências do capital.
(Caio Laprano - Primeiro Ano - Noturno)
Nenhum comentário:
Postar um comentário