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segunda-feira, 1 de abril de 2024

 A masculinidade e o fato social 

O clássico sociólogo Émile Durkheim definiu os fatos sociais como situações gerais, externas e coercitivas na sociedade, que se estabeleciam nessas normas a fim de analisar eventos da coletividade. E a partir dessa lente muitas situações podem ser vistas, como parte de um todo na vida geral dos membros dessa sociedade, e sob essa ótica o tema da performance da masculinidade heteronormativa pode ser compreendido. Portanto, o fenômeno associado ao papel e o ao que faz o homem na sociedade enquanto figura masculina é definitivamente algo que se encontra situado sob essas classificações em diversas maneiras. 

Ao longo de um processo histórico complexo e extenso, a masculinidade na sociedade ocidental foi formada a partir de valores heteronormativos e de virilidade com toques militaristas, pautada em papéis que representem força, dominação, agressividade, frieza e uma plena restrição emocional. E este papel é contraposto por um tradicional papel feminino, que ameaça este ideal masculino, com tudo aquilo que se aproxima desta suposta feminilidade sendo tratado com repulsa nessa construção masculina, ou seja, para a visão do papel hegemônico masculino a masculinidade se encontra naquilo que é não feminino e não homossexual. Logo a partir dessa condição, o conceito estabelecido é posto e imposto, sempre colocado em uma reação brutal ao que se distancie, pois se aproximaria da ameaça, se caracterizando, portanto, em uma generalidade, pois os homens se encontram sob esse guarda-chuva do papel masculino ocidental, uma externalidade, pois é determinado não por quem se encontra nesse papel, mas por uma estrutura histórica, e coercitivo, pois aquilo que foge ao papel tradicional é atacado com brutalidade, pois novamente, aproxima-se dessa suposta ameaça ao próprio castelo de vidro masculino. 

 Ademais, a masculinidade heteronormativa como fato social é uma constatação não apenas individual, mas que atinge níveis ampliados com a dominação masculina. Para exemplificar, a questão se torna um fato ainda mais geral e coercitivo, quando todos são afetados por essa condição, mesmo quem, a princípio, não se encontra nesse papel, pois com essa criação do ideal viril as relações interpessoais tornam-se dependentes desses pontos, como uma exigência não apenas de ser e cumprir um papel tradicional, mas de performá-lo diante da sociedade, mantendo uma aparência para esconder os desvios a esse ideal, o choro, a emotividade, a sensibilidade, o medo, a fraqueza e diversas outras sensações. Assim sendo, o ideal masculino se estabelecendo como um repressivo fato social, a cadeia de ações disso derivada é catastrófica e ainda mais coercitiva, fazendo com que sua perpetuação seja cada vez mais imposta e agressiva, pois conforme os sinais de mudança avançam, e na atual sociedade eles avançam, o medo da ameaça parece cada dia mais forte, colocando-se diante da própria inaptidão em ser um humano completo, sempre preso ao ideal que deve ser cumprido que se distancie do que é diferente. 

Estabelece-se também dentro do conceito do fato social uma questão, sendo ele uma visão de normas sociais de uma determinada sociedade, esses fatos podem ser modificados, mudados rumo a outro caminho, até de própria extinção desses papéis. E no atual momento urge-se a mudança da visão sobre o masculino, levemente em curso, uma mudança drástica é necessária, pois ao manter-se na atual estrutura, externa, geral e coercitiva, homens e meninos seguirão sofrendo para se adequar a aquilo que não são, pois não representam um ideal coletivo imposto para eles no momento de seus nascimentos, mas sim outras formas de exercer uma masculinidade, ou masculinidades. Então, o momento vivido atualmente é encaixado em um fato social que se encontra em mudança gradual, que procura libertar mais a cada geração os indivíduos dessa patrulha coercitiva do ideal masculino, e dos gerais efeitos negativos que se sucedem em relações interpessoais derivadas, de forma a compreender de forma mais plural e inclusiva os papéis e ações que o homem exerce, mais do que apenas permitir-lhe chorar. 

Dessa forma, fica exposto como a condição masculina na sociedade é um fato social que sufoca a própria vida do homem e daqueles em seu entorno, o coagindo sob pena de repressão social e muitas vezes física. E até olhando para a questão na contemporaneidade, percebe-se uma propagação de novas masculinidades, novos conceitos, que abrangem outras formas de se ver e se colocar o papel do homem, que ganham um caráter cada vez menos de fato social, principalmente se colocando distante da coercitividade, tão exercida no modelo tradicional do masculino, mas a caminhada é dada a passos lentos e os efeitos do fato social ecoam na sociedade como em uma caverna, e sempre se põem como barreira para a mudança. Dessa maneira, conclui-se que o fato social descrito mesmo em mudança segue mantendo sua estrutura em forma e conteúdo, em fato social e em tema presente na sociedade, mas que apesar dos efeitos negativos que causou e causa, um certo enfrentamento a esse fato vem sendo exercido, mostrando também como o conceito se coloca em movimento e dependente do andamento das normas sociais do coletivo. 

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