A imagem que o homem
tem de si mesmo diante da natureza mudou muito através dos anos: o ser humano
já se viu como parte dela; como parte de um propósito divino; como seres
superiores aos outros presentes no planeta Terra; entre outras visões. O homem
moderno, por sua vez, compreendia a grandiosidade da natureza e sua
independência em relação ao ser humano — mas, ainda assim, se julgava capaz de
dominá-la pelo benefício da humanidade. Com a chegada dos tempos
contemporâneos, o ser humano se deparou com o pior lado de si mesmo: os
resultados de tanta procura por poder se manifestaram na Primeira e Segunda
Guerra Mundial, e eles não foram bonitos — ao menos não para todos.
Para entender como a
sociedade tomou esse rumo, é necessário voltar à modernidade, anos que
sucederam a Idade Média — em que o conhecimento científico estava praticamente
estagnado e preso à tradição - e que a busca por conhecimento renasce na
humanidade e, dessa vez, vem para ficar. A filosofia estudada até então era
baseada na que foi produzida na Grécia Antiga (em sua maioria), época em que o
homem via a razão como sua maior virtude. Em oposição a essa tradição
filosófica, na visão do filósofo moderno Francis Bacon o experimentalismo
também era importante na busca do conhecimento. Para ele, o conhecimento tinha
que ter alguma aplicabilidade - pois com esse tipo de conhecimento o ser humano
poderia aprender a entender a natureza e dominá-la, essencial para expandir os
horizontes da humanidade. Nota-se em seu raciocínio o início da busca da dominação
da natureza, que se concretizou como motivação do homem na procura do
conhecimento, assim como Bacon disse que deveria ser.
Ainda na Idade
Moderna, outro filósofo duvidava da tradição intelectual que guiava seu tempo -
e não só dela, mas duvidava de tudo. Para Renée Descartes, era necessário
duvidar para alcançar o conhecimento, e assim como Bacon ele duvidou daqueles
que o antecederam. Na visão cartesiana, muito do que foi produzido
anteriormente era inútil para a humanidade em termos práticos e era por isso
que o ensino tradicional era falho — para ele, a ciência deve ser usada para o
bem do homem, o que pode ser feito através da dominação da natureza. Aqui,
nota-se a semelhança no pensamento de dois grandes filósofos modernos: a ideia
de que a ciência é o instrumento pelo qual o homem irá dominar a natureza para
se beneficiar.
Por motivos óbvios,
Bacon e Descartes não viveram para ver o que ocorreu nos séculos seguintes:
ficariam felizes ao ver que o homem realmente buscou conquistar a natureza
através do conhecimento científico. Porém, gostaria de saber o que diriam se
vissem os grandes desastres ambientais causados pela busca incessante do homem
por poder, ou episódios como o de Hiroshima e Nagasaki que foram causados pelo
mau uso do conhecimento atômico. No filme "Ponto de Mutação" uma das
personagens discursa sobre esse assunto, dizendo que abandonou a vida
científica ao ver o que era feito com sua pesquisa que poderia ser usada para a
evolução da medicina, mas foi aplicada no campo bélico. É evidente que, nessa
busca pela dominação da natureza, o homem se perdeu na própria ganância: entre
ter poder e garantir um mundo adequado para as futuras gerações, a humanidade
escolhe a primeira opção sem pestanejar, mesmo que ela signifique destruição.
Há alguns
séculos atrás, como na época de Descartes e Bacon, essa busca incessante por
poder sobre a natureza fazia sentido — a humanidade não conhecia os próprios
limites, quem dirá os da natureza. Entretanto, ainda ver o mundo como algo a
ser dominado e explorado pelo homem depois de assistir todos os acontecimentos
desastrosos que se sucederam por causa do mau uso da ciência é negligenciar a
ganância dos seres humanos e a necessidade que a vida humana tem de um planeta
'saudável' — pois se a raça humana inteira for extinta, a Terra continuará
existindo por milhões de anos, mas se a Terra perecer (como está perecendo
agora pelas mãos humanas) a humanidade não dura um dia.
Portanto, é evidente
que o pensamento de Bacon e Descartes em relação à natureza foram muito úteis e
revolucionários para sua época. Todavia, agora que o homem tem uma clara noção
dos limites naturais e éticos-sociais que não podem ser ultrapassados, é
estupidez agir como se eles não existissem e viver sob pensamentos de quatro
séculos atrás — isso pode ser exemplificado com uma frase do filme Ponto de
Mutação: "É tolo uma sociedade apegar-se a velhas ideias em novos tempos
como é tolo um homem tentar vestir suas roupas de criança." Se não pela
natureza e sua singularidade, o homem deveria ao menos pensar em si mesmo já
que é o que faz de melhor: como vamos viver em um planeta que destruímos?
Camilly Vitória da Silva, 1º semestre de Direito - Noturno (Turma XXXVIII)
Camilly, parabéns!
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