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segunda-feira, 5 de julho de 2021

Ética, crise ecológica e a ingenuidade dos seres

 “Penso, logo existo”. A célebre frase do filósofo francês René Descartes sintetiza o que passaria a caracterizar a essência do pensamento científico moderno: a valorização da racionalidade humana. Ambientada na transição da Idade Média para a Idade Moderna, essa nova corrente filosófica supera as crenças e superstições que contaminavam a produção de conhecimento durante o período medieval e passa a fundamentar seu pensamento sob a ótica do antropocentrismo, questionando não mais o que é a verdade, mas sim como é possível atingi-la, utilizando o racionalismo e o empirismo como as duas principais bases epistemológicas de orientação para o desenvolvimento de um método científico.

Nesse contexto, o filósofo racionalista René Descartes desempenha um papel fundamental na consolidação do pensamento científico moderno. Em sua obra “O Discurso do Método”, ele discute de que maneira a razão humana deve buscar o conhecimento sólido e a verdade irrefutável, adotando uma postura cética de crítica diante do dogmatismo da opinião. Desse modo, Descartes pontua a necessidade de tudo duvidar, colocando em questão, inclusive, a sua própria existência, pois, segundo ele, nossas crenças, nosso senso comum e, principalmente, nossos sentidos são capazes de nos enganar e tomar conta do nosso intelecto.

Além disso, é importante destacar o filósofo inglês Francis Bacon, outro importante propagador da ciência moderna e do empirismo como produção de conhecimento. Em sua teoria, Bacon propôs a existência dos ídolos, falsas noções e hábitos mentais presentes no intelecto dos homens - responsáveis por prejudicar o avanço da ciência e da racionalidade - daí a urgência de ultrapassar os erros e regular a mente humana através de um método indutivo baseado na observação precisa e minuciosa dos fenômenos da natureza, a experiência. Nesse sentido, infere-se que, apesar de representarem teorias com embasamentos distintos – racionalismo e empirismo -, os dois pensadores concordam no que diz respeito ao propósito da ciência moderna: a transformação da vida dos homens e a dominação da natureza.

À luz dessa ideia, a filosofia moderna traz consigo o conceito de que a ciência deve comportar-se como elemento voltado para o bem-estar dos seres humanos e a produção de conhecimento como atividade pública na luta contra a natureza. Todavia, uma leitura insensata desses princípios fez com que a racionalidade humana se desviasse dos critérios da ética e, por conseguinte, envaidecesse os homens a ponto de influenciar negativamente as relações do mundo contemporâneo.

Mudanças climáticas, aquecimento global, perda de vegetação nativa, extinção de espécies e destruição da camada de ozônio são alguns exemplos do que a dominação predatória da natureza foi e é capaz de refletir em toda vida existente na ecosfera. A antiga e comum concepção de que conhecimento é poder, quando erroneamente interpretada e aplicada é responsável por colocar os homens acima dos demais indivíduos, sob um viés autoritário que não busca a convivência harmônica com a natureza, mas sim a supremacia dos desejos dos seres humanos a qualquer custo.

Essa discussão ganha maior amplitude no longa-metragem “Ponto de Mutação”, no qual as personagens debatem acerca da relação homem-natureza, afirmando que, diferente do que diziam os filósofos modernos, os seres humanos e o planeta são, na verdade, um só, uma só realidade e uma só consciência. Em conformidade com esse pensamento, inúmeros movimentos de resgate da natureza vêm sendo disseminados na atualidade, como a proibição do uso de canudos plásticos, a diminuição do gasto de água e o descarte consciente de resíduos. Contudo, apesar de significarem o início de uma mudança, essas pequenas atitudes passam uma falsa ideia de restauração do planeta quando, na realidade, são insuficientes para reverter toda a destruição que foi feita durante todos esses anos.

Dessa forma, a ausência de uma análise mais minuciosa da realidade, como foi proposto pela própria filosofia moderna, faz a população esquecer o verdadeiro responsável por essa exploração que se instaurou. A maximização dos lucros que conduz o modo de produção capitalista tem por base a exploração, alienação e expropriação da força de trabalho juntamente com a deterioração da base de produção econômica – a natureza. Logo, a consolidação do capitalismo foi historicamente sustentada pelo domínio e transformação de tudo em mercadoria, estabelecendo uma contradição pois, tal postura destrói a base de acumulação desse sistema, tornando-o insustentável.

Em suma, a essência do pensamento moderno faz-se necessária ainda nos dias atuais, uma vez que a racionalidade humana e a investigação da realidade são indispensáveis para evitar que o senso comum e a negligencia de informações superem a produção segura de conhecimento. Em vista disso, a ciência deve ser utilizada para examinar cautelosamente a origem dos problemas, fazer questionamentos e transformar a vida dos homens sem comprometer sua existência e sua relação com os demais seres pois, como afirmou bacon, teoria e prática devem caminhar juntas; ciência e ética são faces de uma mesma moeda.

Giovanna Cardozo Silva - Turma XXXVIII - matutino

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