Boaventura de
Sousa Santos discute várias perspectivas aplicáveis a diversos contextos
sociais atuais no Brasil, sendo um deles a política pública de cotas raciais nas
universidades. Há pouco mais de 5 anos, o STF (Supremo Tribunal Federal) deu
validade à adoção da política de cotas raciais nas instituições de ensino superior
do país por meio de um julgado do DEM contra o sistema de adoção de cotas da
Universidade de Brasília, no qual o sistema da UnB tornou-se válido.
Analisando
esse julgado sob a ótica de Boaventura, podemos tecer diversos argumentos e
visões sobre as cotas raciais.
Para começar,
é necessário que se destaque a diferença entre a igualdade material e a
igualdade formal. As cotas realizam a igualdade material, que seria ampliar as oportunidades
dos grupos menos favorecidos de modo a igualá-las as do restante da população.
Visto que existe uma desigualdade histórica e discriminatória racial no Brasil –
não houve política pública de reintegração do negro na sociedade e a inserção
dele no mercado de trabalho quando houve a abolição da escravidão – a igualdade
formal, que seria a igualdade de todos perante a lei (no âmbito jurídico), não
poderia dar aos negros e índios as oportunidades “adequadas e suficientes” de
ingresso no ensino superior. Assim, torna-se necessária a adoção da política de
cotas.
Boaventura
discute a tensão dialética entre a emancipação (lutas sociais) e a regulação
(controle social). Para ele, essa tensão dialética deve ser recuperada e é
justamente nela que a modernidade vai se constituir. A emancipação deve estar
dentro da regulação, ou seja, dentro do direito, e em determinado momento esses
dois conceitos passam a convergir. A perspectiva desse autor é a de que se
possa ocupar o direito com perspectivas emancipatórias, ou seja, as lutas
sociais só surtirão efeitos se estiverem dentro dessa regulação, desse controle
social, que nada mais é que o direito. Portanto, a validação da política
pública de cotas raciais pelo STF é justamente a inclusão dessa luta social na
regulação, pois ela passa a fazer parte do Estado e do direito, legitimando-a
sob a ótica do direito. E é isso que Boaventura quer nos fazer enxergar na
tensão dialética entre a emancipação e a regulação.
Boaventura
propõe a perspectiva do direito como zona de contato com quatro formas de
existência nessas zonas de contato – violência, coexistência, reconciliação e
convivialidade. Nesse caso, a universidade seria importante pra fazer a ponte
entre essas zonas de contato e promover a convivialidade – saber lidar com a convivência
intercultural de modo a desenvolver a tolerância.
Além disso, a
política de cotas pode promover o diálogo intercultural de Boaventura, a ideia
da concepção de direitos humanos mestiço, o cruzamento de culturas já que ele
trabalha com a ideia de que todas as culturas são incompletas. Ele propõe pensar
em experiências possíveis e na mobilização do direito no hemisfério sul como
uma possibilidade de mudança social.
Conclui-se que
as cotas apenas iniciam a solução desse problema da exclusão social e é uma
medida transitória por não termos recursos estruturais para mudanças efetivas.
Entretanto, para Boaventura, esse é o germe da sociologia das emergências, não
é a solução efetiva, mas o ponto de partida. Não é a emancipação em si, mas o
instrumento de mudança.
Anita Bueno Tavares - 1° Direito diurno
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