A maldição de Cam
Cam foi um personagem bíblico, filho de Noé. Segundo as
escrituras, após o diluvio, Cam deparou-se com seu pai embriagado e nu, e ao
invés de respeitá-lo, chamou seus irmãos para que pudessem se entreter com o
ocorrido. Noé amaldiçoou seu filho, e segundo estudos religiosos, Cam teria se
dirigido ao continente Africano, onde constituiu família e teve descendentes.
Religiosos utilizaram essa passagem da bíblia para
justificar a escravidão africana, alegando que aqueles que nasceram no continente
Africano eram amaldiçoados e por isso deveriam ser escravizados. A cor da pele, portanto, passou a ser uma
demonstração da marca dessa maldição. Vemos, portanto, que argumentos
religiosos foram utilizados para que interesses econômicos e pessoais fossem
alcançados, como por exemplo aquisição de mão de obra para a exploração de
terras descobertas, tal como o povo europeu fez no território americano.
A história do Brasil, por exemplo, foi marcada por episódios
de exploração sórdida e sangrenta do homem branco sobre o negro. Logo nos
primórdios da colonização a mão de obra africana foi utilizada em larga escala
para atender as necessidades do povo europeu no território brasileiro.
Massacres, genocídios, estupros, humilhações, agressões e racismo foram
inerentes ao desenvolvimento da história brasileira. Contudo, apesar da
abolição da escravidão, a mentalidade escravocrata não foi extinto no país, e
continuamos vivendo em tempos de preconceito explícito, segregação e a falta de
recursos para a inserção social do povo negro.
Apesar da promulgação de leis como a Áurea, Ventre Livre e
Sexagenários, pouco foi feito para que o negro fosse emancipado. Boa Ventura,
em sua obra “Poderá o Direito ser Emancipatório?” analisa a questão de como o
instrumento jurídico pode ajudar as minorias na aquisição de direitos, e
constatamos que o autor conclui que há um impedimento institucional para que
essas minorias possam ter participação política e ter seus direitos sociais assegurados.
Mas e as cotas raciais? Não constituem um instrumento para a
integração do negro na sociedade? Na teoria sim, mas na verdade a cota é um
instrumento fraco e que caminha a passos lentos para a igualdade de oportunidades
e direitos. Vemos esse instrumento ser utilizado nas universidades mas seu efeito
tem trazido poucos resultados contundentes. Apesar de vermos o público negro
aumentando gradativamente nas instituições de ensino superior por intermédio da
reserva de vagas, ainda constatamos um apartheid no mercado de trabalho, nas
relações sociais e no âmbito econômico. O preconceito ainda está enraizado em
nosso cotidiano, e as cotas solucionam uma parte mínima desse problema.
Dessa forma, vemos que a maldição de Cam persiste na
atualidade, e que a segregação e o preconceito que eram argumentos religiosos
respaldados pelas escrituras bíblicas continuam a existir na atualidade. As
cotas devem existir, mas ainda é pouco comparado ao que se pode fazer para o
negro seja emancipado de fato.
Wagner Galdino dos Santos , 1º ano, Direito Noturno
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