O grande mestre Ítalo Calvino
ensinou uma vez que um “clássico é um livro que nunca terminou de dizer aquilo que
tinha para dizer”. Complemento-o: a importância
de um clássico não se restringe ao passado ou ao presente; reside na sua posterioridade.
Nesse sentido, para que se
entenda o arcabouço principiológico que sustenta a implantação de cotas
raciais, como uma das medidas paliativas para redução da desigualdade racial no
Brasil, creio que seja de máxima importância entender o princípio da isonomia
aristotélica.
Antes disso, no entanto,
atentemo-nos ao art. V da Constituição Federal de 1988. Este, impõe a todos
tratamento igualitário perante a lei, não permitindo favorecimentos ou
privilégios por quaisquer motivos. É a chamada igualdade formal.
Mas talvez, mais importante que
esta, seja a igualdade de condições. A igualdade
material/substancia por assim dizer. Ocorre que muitas vezes, para garantir
a igualdade de condições, uma igualdade no plano fático, necessita-se de certa “discriminação
legal. ”
Veja, é nítido e claro que nem
todos são iguais no plano material, sobretudo num país como o Brasil. E é exatamente aqui que entra Aristóteles. Ele
nos ensina que isonomia é diferente de igualdade. Que isonomia não é garantir
igualdade no papel, e sim “tratar os iguais igualmente e os desiguais
desigualmente, na exata medida da sua desigualdade. ” Não é fazer com que um
tenha algum “privilégio” sobre o outro. É permitir igualdade de condições, independentemente
da cor da pele de cada um.
Tudo isso está em conformidade
com as ideias de Boaventura, uma vez que, para ele, grosso modo, o direito mão
é mero agente passivo no mecanismo de poder. Ele é, e assim que deve ser,
transformador. Emancipador. A luta
deveria, portanto, começar por aqui. Até porque, parafraseando Von Jhering, a
meta de toda lei é a paz; a harmonia. Mas a forma de obtê-la é a guerra. Guerra
esta seja das nações, do Estado, das classes ou dos indivíduos. Enquanto a lei
estiver compelida à coesão social – e isso ela estará compelida até os fins dos
tempos – ela não pode dispensar a batalha.
Lucas Valeriano, Noturno
Lucas Valeriano, Noturno
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