Como alertava Descartes, o método científico precisa ser
orientado pela razão e observar a realidade como ela é, distanciando-se do
conhecimento originado apenas do hábito, do senso comum, desprovido de uma
análise mais profunda de determinado objeto. Um exemplo, vindo da área de
educação, de como uma manipulação rápida da razão pode levar a conclusões
enganosas, é a relação entre políticas de não-repetência e a qualidade da
educação dentro do ensino público.
Em pesquisa recente (2014) do Sindicato dos
Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo (Apeoesp), verifica-se que
a larga maioria dos professores, pais e mesmo alunos, é contra o modelo de progressão
continuada no ensino fundamental, adotado pelo Estado paulista. O principal
argumento contra esse modelo é a percepção de que os estudantes passam de ano
sem aprender as matérias. Outras razões são a perda de autoridade dos
professores sobre a classe e a falta de esforço dos alunos.
Entretanto, estudos realizados por diversas
instituições (Todos pela Educação, UFMG, Educação para Todos e outros)
demonstram, por meio de pesquisas estatísticas, que não há uma melhora do
ensino ao se comparar o sistema seriado, em que há retenção do aluno, e o
sistema de ciclos, com progressão automática. Na verdade, verifica-se que a dificuldade
de aprendizado do aluno reprovado aumenta ao longo do tempo e que a evasão
escolar é uma consequência frequente. Um dos estudos também aponta que a
proficiência dos alunos repetentes é menor quando eles estudam em colégios que
também têm desempenho ruim.
Uma pesquisa da Unesco sobre o índice de reprovação na
8ª série (dados até 2005) mostra que o Brasil é um dos países que mais reprovam
no mundo, muito mais do que a média da América Latina, ou de países com menor
poder econômico, como o Haiti. Alguns países como Austrália, Coreia, Japão,
Suécia, e outros, adotam o sistema de progressão continuada em todas as séries
do ensino fundamental, indicando que o modelo não é necessariamente ruim. No
Chile, por exemplo, só é possível reprovar a partir da 5ª série e em Cingapura,
a partir da 6º série.
A despeito dessas constatações, cabe observar que, em Novembro
de 2013, o Governo do Estado de São Paulo anunciou um plano de reforma da
educação da rede estadual que, dentre outras medidas, aumenta a possibilidade
de reprovação do atual sistema. As reprovações que podiam ocorrem apenas nos 5º
e 9º anos do ensino fundamental, agora serão possíveis nos 3º, 6º e 9º anos. No
ensino médio continua o modelo de reprovação em todos os anos.
Descartes ensinava que era preciso repartir as dificuldades em quantas parcelas fossem possíveis e necessárias a fim de melhor solucioná-las. Nesse sentido, no caso concreto, é necessária uma análise mais detida das parcelas que compõem o comprovado problema da baixa qualidade do ensino no Brasil. Os fatos indicam que o modelo de ciclos com progressão automática não é o fator preponderante nessa questão, sendo necessário observar também aspectos salariais, de infraestrutura das escolas, de compromisso dos pais com o aprendizado de seus filhos, dentre outros.
Fernando - 1º ano Direito noturno
Nenhum comentário:
Postar um comentário