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domingo, 13 de maio de 2018

Dura lex, sed lex

    Situações recorrentes no âmbito jurídico brasileiro demonstram a relevância da aplicação de variados conceitos sociológicos dos mais consagrados autores do ramo, os quais visam uma análise científica e social da realidade que os permeiam. Assim sendo, torna-se necessária a abordagem ideológica do famoso julgado denominado, em modalidade informal, de "Pinheirinho", sob a óptica de Max Weber (1864-1920). 
    Nesse sentido, a problemática do caso centra-se no cumprimento da ordem de reintegração de posse de um terreno de 1, 3 milhão de metros quadrados à massa falida da empresa Selecta, pertencente ao grupo Naji Nahas, desconsiderando-se a circunstância de o território estar ocupado por seis mil indivíduos necessitados, por oito longos anos. Após variados e complexos debates e conflitos, perpetuados na própria dimensão jurídica, questiona-se, logicamente, o motivo da não confluência opinativa entre os membros desse ambiente tido como moralmente legal, pela maioria populacional. 
    Primordialmente, então, julga-se a postura decisória da juíza responsável pela ação de reintegração de posse, ramificando-se o pensamento em duas vertentes: a inserção total da referida na significação de sua ação social, inspirada esta em certos valores culturais, ou a utilização da acepção do termo "poder", isto é, se ela agiu desse modo em decorrência de sua crença real nessa atribuição de sentido, ou foi uma tentativa de má-fé de imposição de seu poder, no momento que, segundo Weber, o ser impõe a própria vontade numa relação social, mesmo contra resistências, seja qual for o fundamento dessa ação.  
    Em segundo plano, valida-se a verificação das ponderações e críticas referentes à ciência do Direito no sistema capitalista, de acordo com o pensador. Sob o prisma deste, a Modernidade circunda-se de divergentes processos de racionalizações, dos quais são abrangidos, nos mecanismos legislativos, as racionalidades formal e material. Sendo a primeira concernente ao caráter calculável das ações e seus efeitos, baseando-se em algo abstrato, a segunda liga-se à imposição de valores de certos grupos, tais quais, por exemplo, exigências éticas e políticas. Logo, faz-se evidente a relação entre a racionalidade material e a decisão da juíza, a qual, manifestando apenas suas considerações, sem levar em conta seus possíveis atos de má-fé, estaria em um intenso conflito com a própria Justiça, em virtude de uma certeza relacionada ao predomínio das determinações do mercado, haja vista que este define o "justo", o "correto". Dá-se um elemento exemplificativo dessa afirmação no instante no qual a juíza lança a indagação se não haveria a possibilidade de destinar outra área, de custos menores e melhor planejamento, aos habitantes do terreno, referindo-se à lógica capitalista de mercado.
    Por outro aspecto, sobressai-se a dualidade do Direito, no que tange ao sentimento de justiça espontâneo e o Direito "artificial", produzido racionalmente para determinada finalidade. Desse modo, a Justiça Federal, salientando a possibilidade de o terreno disputado ser provindo de fontes fraudulentas e realçando a função social da propriedade (garantida pelo artigo 5° da Constituição Federal de 1988), formaliza a tentativa de efetivar o justo, enquanto que a juíza materializa a aplicação literal das normas jurídicas, defendendo, Dura lex, sed lex, o direito de propriedade da massa falida, representando, para Weber, a transição do ético juridicamente formal ao utilitário e tecnicamente material.
    Dessarte, visibiliza-se que a não confluência de opiniões, referente ao caso "Pinheirinho", é consecutiva diretamente da valoração da ação social e/ou do mecanismo de poder, influenciada, a juíza, pela racionalidade material condutora à logica capitalista de mercado, efetuando, por fim, a efetivação das leis escritas pertencentes à dualidade do Direito, malgrado não haja a promoção de um sentimento de justiça em suas decisões. 


Giovanna Siessere Gugelmin - direito matutino - turma XXXV







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