Na
modernidade, a burguesia vinculada ao racionalismo jurídico, que se distanciou
de normas jurídicas alicerçadas no direito imanente às vontades divinas, trouxe
à concepção de direito natural a inerência de direitos em favor às necessidades
humanas, de maneira a valorizar as próprias teorias burguesas de modelos políticos – econômico.
Observando essa mudança na fundamentação
do referido direito, Max Weber em “Economia e Sociedade” afirma que “O direito
natural é, por isso, a forma específica de legitimar as ordens
revolucionariamente criadas”. Essa classe do então terceiro estado utilizou, nesse
sentido, a liberdade de contratos, que alude, por exemplo, à propriedade
privada e às relações comerciais surgidas, como uma das bases de seus
ordenamentos jurídicos. Em concordância com esses, a Constituição brasileira
representa a positivação de um direito intrinsicamente burguês, o qual apesar
de garantir o princípio da sociabilidade não retira do cotidiano a
individualidade, as desigualdades e os problemas sociais. Assim, a questão
fundiária – destacada, principalmente, no caso da reintegração de posse do
Pinheirinho em São José dos Campos - é um problema alarmante responsável por
violências físicas, morais e violações dos direitos humanos, e evidencia tanto a
parcialidade como a falta de racionalidade formal do judiciário. Desse modo,
tem – se que o direito brasileiro se baseia, amplamente, na defesa de
interesses que possuem finalidades econômicas – materiais, e não protege a depravação
de maiorias sociais que são deficientes sócios- econômico.
A
dissonância entre o tipo ideal, de Weber, e a realidade, nesse contexto, está
atrelada à parcialidade encontrada no direito. Esse assegura no artigo 5º,
XXIII, CF,que “a propriedade atenderá a sua função social”, isto é, se, como na
situação do Pinheirinho, onde antes da ocupação era uma imensa área vazia, a
propriedade não estiver contemplando uma função, pode ser entregue à
desapropriação. No entanto, a juíza Márcia Loureiro, ignorando a função social
da propriedade, a obscuridade de apropriação do terreno pela empresa Selecta, a
indeferição da liminar pelo juiz da 6ª Vara Cívil de São José dos Campos, o não
pagamento de ônus fiscais pelo proprietário – o que contraria o art, 1276, 2º,
CC - e o direito fundamental à moradia, art. 6º, CF, concedeu a reintegração à Massa Falida. Nesse
espectro, está claro que o ordenamento, contudo disponibiliza dispositivos para
sanar as questões sociais de moradia, não é suficiente para impedir a
arbitrariedade e, logo, a defesa de aspectos puramente materiais pelos empoderados
juridicamente. Assim, a metodologia da tipo ideal, no país, ilumina os
interesses em prol da desigualdade social.
As
restrições à terra, medidas em prol de desejos burgueses, nessa perspectiva, são
historicamente responsáveis pela disparidade no âmbito de apropriação. O
direito brasileiro de 1850 previu a “Lei de Terras”, que impediu com que
imigrantes e escravos adquirissem propriedade, uma vez que a partir de então
essa deveria ser comprada. Essa mentalidade protecionista e aspirante dos
privilégios permaneceu na sociedade e as ações sociais da juíza Marcia ante o
Pinheirinho a evidencia. Pode – se, assim, também tentar justificar a opção da
magistrada em agir materialmente através do que Weber diz sobre os juristas
modernos passarem a apresentar mais relação com os poderes sociais na medida em
que diminui – se a fé no direito natural, ou seja, quando deixa – se de
acreditar em uma naturalidade transcendental do direito a racionalidade ganha
força e, por conseguinte, os juristas têm o poder de atribuir a imanência a
seus interesses e, dessa maneira, tendem a se colocar ao lado dos poderes
dominantes em detrimento da defesa de direitos dos desfavorecidos.
A
arbitrariedade dos aplicadores do direito, baseados, majoritariamente, na mentalidade
material – econômica, nesse cenário, intensifica o aumento das desigualdades.
Essas porque são provenientes do distanciamento cada vez maior de qualidade de vida
entre, por exemplo, os esbulhadores e o esbulhado e reiteradas com comportamento totalmente
desiquilibrado, entre qualidades formais e materiais, do direito brasileiro, são favorecidas.
Desse modo, pauta – se uma ordem social onde uma maioria pobre continua sem
acesso à equidade e, consequentemente, a bens fundamentais como a moradia,
saúde e educação digna.
O
julgamento do Pinheirinho ilustra, portanto, um direito precário quanto à aplicação
de seu conteúdo, já que a comunidade formada nesse bairro foi subjugada a
decisões jurídicas escassas de justiça, que contrapõem, inclusive, ao próprio
ordenamento jurídico. Juristas parciais e alienados a uma materialidade econômica
e de representatividade social corroboram para que a sociabilidade deste seja restringida e, logo, esbulham direitos dos desprivilegiados. Assim, tem – se um direito que não protege os desprivilegiados na prática e
promove a manutenção das desigualdades e de uma racionalidade weberiana
mais material do que formal.
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