Os ínclitos direitos humanos foram desenvolvidos,
paulatinamente, na defluência da quase totalidade da história humana, desde os
seus primórdios, cujas raízes fidedignas podemos encontrar na Babilônia, até a
hodiernidade. Inerentes a todos os seres humanos, independentemente de qualquer
característica que tenha a capacidade de torna-los, de alguma forma, singulares,
esses direitos possuem a una e sui generis função de promover o mínimo e
indispensável para o engendramento de uma vida digna.
Diante das ignóbeis opugnações contra essa legítima
ferramenta de proteção do humano observadas, particularmente, no período em que
as grandes guerras estiveram em seu acme, revelou-se uma eminente e cognoscível
necessidade de fazer tais direitos se valerem de forma factual. É desta forma
que surgem congressos e deliberações acerca das atitudes a serem tomadas pelos
mais diversos países, dentre eles, o Brasil.
Voltando-se, no entanto, para um estudo não necessariamente
perscrutado da história brasileira, o que se nota é um cenário contraditório.
Desde sua gênese, o Brasil apresenta uma extensa série de desrespeitos aos direitos
humanos e o que se esperava que fosse uma prática enjeitada provou-se,
conquanto, ainda presente na realidade social brasileira.
O caso Pinheirinho, notável quando se expõe minuciosamente a
tese do desrespeito aos direitos humanos, ocorreu em São José dos Campos,
cidade que, apesar de possuir uma das maiores rendas per capita do país, possui
um número hiperbólico de famílias inteiras vivendo em estado de miséria, cujos
direitos vêm sendo, continuadamente, menosprezados. Em janeiro de 2012, as mais de seis mil pessoas que ocupavam o
imenso terreno cuja posse, tecnicamente, pertencia a massa falida Selecta S/A –
muito embora tenha-se surgido intensas altercações relativas a questão da
alteridade entre os conceitos de posse e propriedade – foram violentamente
realocadas devido a intervenção de cerca de dois mil soldados da polícia
militar de São Paulo que estavam agindo de forma a cumprir com a liminar de
reintegração de posse em favor da massa falida expedida pela juíza da 6° vara
civil, Marcia Loureiro.
Uma vez que o
supracitado é posto em realce, torna-se de egrégia e evidente necessidade uma
análise feita sob viés sociológico, de forma a tentar buscar uma compreensão.
Para tanto, traz-se á luz as teorias formulados por Max Weber, sociólogo alemão
que, ao lado de Émile Durkheim e Karl Marx, integrou o trio de célebres
pensadores clássicos incumbidos da fundação da sociologia.
Weber dedicou considerável parcela de sua vida na elaboração
de diversas teorias essenciais para a factual compreensão da realidade social,
teorias estas que encontram, ainda na hodiernidade, grande relevância. Dentre
tais, cabe ressaltar, a título de exemplo, a ação social, que diz respeito as
condutas tomadas dentro de uma sociedade influenciadas por estímulos externos e
que envolvam, necessariamente, outro indivíduo. Uma vez esclarecido pode-se dizer
que, acordando com o pensamento weberiano, o exercício de poder é uma ação
social necessária na manutenção da funcionalidade de uma sociedade, isto é,
faz-se crucial a existência de alguma forma de dominação pelas camadas mais altas
em detrimento das mais baixas, o que, de certa forma, corrobora o modo como as famílias
que ocupavam o terreno foram tratadas.
Outrossim, Weber formulou com igual maestria a teoria das racionalidades,
que dizia, fundamentalmente, existir alguns gêneros destas, dentre elas a
chamada racionalidade formal – referente as formas calculistas do sistema econômico
e jurídico – e a racionalidade material – referente a ações que se deem
voltadas para as influências de convicções e valores pessoais. Inserindo aqui o
caso Pinheirinho, nota-se na decisão tomada pela juíza uma expressão axiomática
da racionalidade formal, uma vez que na tentativa de proceder fazendo uso de
uma neutralidade axiológica, não engendrando valores, o que é naturalmente quimérico,
uma vez que todo indivíduo, enquanto inserido em sociedade é imbuído de
convicções, a juíza falhou indubitavelmente.
Ainda para Weber, o direito, enquanto regulador das relações
humanas, deveria ter um caráter geral, sendo assim, um ‘’ tipo-ideal’’ , quase
utópico, de modo a contemplar a totalidade complexa dos fatos concretos das
sociedades modernas embasadas no capitalismo. Partindo de tal perspectiva,
todos os indivíduos teriam condições igualmente estabelecidas, tendo a
capacidade, portanto, de se equivalerem dentro da sociedade de forma que seria
justo, e até legitimado, que a decisão se desse em favor da massa falida Selecta
S/A.
Defensor da propriedade privada e da livre disposição
destas, para Weber, até certo ponto, seria aceitável que a empresa em questão
fosse privilegiada ao longo do processo judicial, conquanto, para efeito de
conclusão, deve-se levar em consideração que além das supracitadas
convicções do sociólogo, era, de igual maneira, defendido pelo mesmo a
necessidade de asseverar os direitos humanos, primando pelo direito inerente ao
homem de possuir uma existência digna, baseada em justiça e igualdade, e, de
forma obviamente clara, o direito a moradia é fator básico e essencial para a
concretização dessa existência tão almejada por aqueles que – não agraciados
pelo austero espírito capitalista – esperam por sua vez de serem,
verdadeiramente, incluídos na sociedade vigente.
Milene Fernandes Silva ( Direito - Primeiro ano / Noturno - Tuma xxxv)
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