A implementação de cotas raciais
nas universidades públicas iniciou-se na Universidade de Brasília (UnB) em 2004
e, mais de uma década mais tarde, ainda gera uma série de polêmicas e
discórdias.
Um exemplo disso foi a ADPF arguida
pelo Democratas (DEM) em 2006, questionando a constitucionalidade das
cotas que levavam em consideração apenas a questão racial para o ingresso de
estudantes na UnB, utilizando-se para a defesa de sua posição diversos
princípios constitucionais (como por exemplo, o art. 206, I, CF – igualdade de
condições de acesso ao ensino). O DEM também se valeu das ciências biológicas
para fazer valer seu ponto de vista e alegou que o problema era mais uma
questão econômica e social do que propriamente étnico-racial.
Entretanto, é preciso entender
que, à luz do pensamento de Boaventura de Sousa Santos, o sistema de cotas é
uma forma de luta contra hegemônica, que permite o ingresso de uma população
que por muito tempo foi, e ainda é, taxada pela sua cor de pele, permitindo um
ambiente mais plural dentro da universidade pública, de forma que diversas
culturas interajam e se integrem, de forma a fazer morrer, pouco a pouco, o
preconceito.
Além disso, atualmente, a
sociedade está engessada por um fascismo social, resultado de um
neoconservadorismo e do neoliberalismo, que dificulta a integração de minorias
e dos historicamente excluídos, do qual os negros fazem parte, já que, após a
abolição da escravidão, não foram tomadas medidas adequadas para que essas
pessoas ingressassem plenamente no contrato social, situando-susado e, portanto,
entre a sociedade civil estranha e a sociedade civil incivil.
O fascismo social pode se
manifestar de diversas formas. Uma delas é o fascismo territorial, que é o
domínio de determinados espaços por aqueles que possuem alguma forma de
hegemonia (por exemplo: financeira, militar, política). É possível constatar,
nas universidades públicas, um predomínio de uma população branca de classe
média/alta. Nesse caso, as cotas raciais viriam para quebrar essa hegemonia,
fazendo ingressar não apenas uma maior quantidade de alunos negros, mas também
de classes sociais mais baixas da sociedade.
Outra forma de manifestação desse
fascismo social é o fascismo contratual, que reduz a prestação de serviços
públicos a contratos individuais entre consumidores e prestadores de serviços
privatizados. É inegável que a educação virou um negócio, uma forma de lucrar.
Assim, aqueles que puderem “consumir” educação estão muito mais preparados do
que aqueles que tiveram que cursar uma escola pública (cerca de 70% dos
jovens negros estudam em escolas públicas) que, muitas vezes, não oferece o
mínimo necessário para o individuo ingressar no ensino superior. E, a partir
daí, pode-se contestar a alegação do DEM: a existência de cotas raciais
causaria mesmo um desequilíbrio na oportunidade de acesso a educação? Ou, na
verdade, contrabalancearia o descaso que no passado teve-se com a população
negra e que hoje tem com a educação pública?
Portanto, assim como afirmou
Boaventura, o Direito pode ser tanto utilizado como forma de manter a hegemonia
dos grupos dominantes quanto para a emancipação e mudança social, dependendo de
como é interpretado e aplicado. As cotas é um bom exemplo do Direito sendo como forma de mudança social, e sendo o Brasil um Estado Democrático de
Direito, é sua obrigação dar respaldo a essa população que, devido a seu
processo histórico, acabaram sendo excluídos da sociedade, de forma a
concretizar a igualdade formal que tão majestosamente está resguardada na
Constituição Federal.
Luiza Macedo Pedroso - 1º ano Direito diurno
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