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segunda-feira, 1 de dezembro de 2014

Marx lê pinheirinho

            No ano de 2012, na cidade de São José dos Campos, ocorreu um evento que ficou conhecido como o massacre de Pinheirinho. Pinheirinho era uma área ocupada por diversas famílias, ligadas ao MTST (Movimento dos Trabalhadores Sem Teto), desde 2004. Tal área pertencia `a empresa Selecta, que é uma massa falida. Durante muito tempo, a questão teve indas e vindas nas esferas jurídicas e políticas. De um lado, a comunidade, estabelecida a cerca de 8 anos, pedia pela desapropriação da área com base no interesse social, reivindicando o direito a moradia garantido pela Constituição Federeal. De outro, a massa falida e seus credores exigindo a reintegração de posse, baseando-se no seu direito a propriedade privada.
            No dia 22 de Janeiro de 2012, a polícia iniciou a operação de reintegração de posse. Diversas irregularidades foram apontadas antes, durante e depois da operações. Diversos intelectuais e juristas denunciaram a autorização da operação como irregular, e a violência e forma como aconteceu, de ilegal, imoral e contra os direitos humanos.
            O evento é, com certeza, um dos casos mais emblemáticos de uma denúncia, já antiga, de que o direito e o ordenamento jurídicos servem aos interesses e proteção da classe dominante. Em 1843, escrevia Karl Marx o manuscrito do livro que ficou conhecido como Crítica da Filosofia do Direito de Hegel. Nele, Marx criticava acidamente a filosofia do Direito de Hegel, para quem o moderno direito é o ápice do racionalismo e da evolução dos códigos de normas humanas e leis. O revolucionário alemão, ao contrário, afirmava que o direito moderno nada mais é que um instrumento de manutenção da sociedade e dos privilégio burgueses. É sabido, que uma das pistas que levaram Marx moldar essa crítica, foi quando ele pesquisou os processos sobre os roubos de lenhas realizados pelos camponeses. Nesses processos, o moderno direito burguês, com sua proteção da propriedade privada ia contra os antigos direitos dos camponeses de colher lenha nos bosques, item necessário para sua sobrevivência durante o inverno alemão.
           Vemos, portanto, que o caso de Pinheirinho não é fenômeno novo, nem isolado, mas faz parte da própria formação e conformação da sociedade burguesa, de acordo com a tradição marxista. Se analisar-mos o caso, veremos que, no âmbito jurídico, foi um embate entre o direito `a propriedade privada do grupo Selecta, e o direito a moradia e dignidade humana dos moradores de Pinheirinho. Apesar do direito a dignidade humana ser um direito fundamental, e portanto constitucional, que deveria sobrepor-se ao propriedade, não foi isso que ocorreu. É certo que na Constituição Federal os direitos a moradia e a propriedade se equivalem, mas a dignidade humana é princípio fundamental dos direitos humanos e portanto devem ser sempre respeitados. O que, infelizmente, não ocorreu nesse caso.
           Logo, quando colocamos a crítica marxiana ao lado desse evento, é quase inevitável que concordemos com Marx. A atuação dos envolvidos na permissão jurídica da operação de desocupação demonstra como o ordenamento jurídico e seus agentes estão mais dispostos a manter o direito a propriedade, tão caro `as sociedades burguesas, do que garantir o direito a moradia e a uma condição de vida digna.
       

Flávio Macarini Pereira - Noturno
   

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