O pensamento Marxista é considerado, de certa forma, tanto uma evolução quanto uma ruptura da filosofia Hegeliana. Pois o insigne alemão absorve vários elementos da dialética de seu conterrâneo, tais como a teoria da alienação do homem ou a da contradição, contradição que encontra-se em todos os planos (da natureza e da história). Contudo, a crítica ao veterano é veemente e se calca, sobretudo, na visão idealística de Hegel.
Tal visão estipulava que a contradição (geral e total) forçaria o progresso, ou melhor, sua própria solução e, com isso, alcançaríamos, por último, a felicidade. Felicidade esta pautada no conceito de liberdade, por isso o filósofo foi grande admirador da Revolução Francesa. Para ele, a escalada do projeto burgues, isto é, de um Estado de Direito, como pretendia-se com a revolução, era o início do processo de libertação, de emancipação do homem. O Direito é aí peça proeminente, uma vez que é o mediador entre as desavenças sociais, sendo, idealmente, capaz de estabelecer o justo e de garantir a liberdade.
Marx repudia a dialética do ideal, do quimérico; volta-se a práxis, isto é, busca o mundo real, pretende formular a filosofia por meio da prática, edifica-a através da analise do que é palpável e, desta maneira, refuta qualquer filosofia pautada sob conceitos abstratos. A contradição conjecturada por Hegel, ao entender de Marx, baseia-se, na verdade, no conflito de classes, no embate histórico entre os potentados e os desapoderados. A revolução burguesa não veio a mudar isso, de fato, só trocou o termo para os detentores dos meios de produção e os despossuídos. Enquanto ao direito, avalia-o como instrumento de legitimação tanto de valores como do próprio poder e domínio da classe prevalecente, ao passo que serve, também, como mecanismo de opressão e coação às demais classes.
Um caso recente e bastante ilustrativo, em relação à sobreposição da práxis marxista à abstração hegeliana, é o que se resolveu denominar Pinheirinho. Em suma, tal caso consiste no conflito a respeito da posse de uma grande propriedade na cidade de São José dos Campos. A propriedade estava, aparentemente, abandonada ou, ao menos, improdutiva até 2002, visto que nesse ano começou a constituir-se um assentamento "ilegal" na área. A massa falida, em 2004, entrou com uma ação judicial, muito embora o processo só fosse concluído a seu favor, decidiram pela reintegração, em 2011; o problema é que neste ínterim 1700 famílias lá se estabeleceram. Ademais, a massa falida era uma empresa do ramo especulativo e devia, apenas para a prefeitura, 10 milhões, sendo o valor da área especulado em 8 milhões.
Por fim, é patente que o direito a propriedade acabou por prevalecer ao direito a moradia, moradia esta para quase 6000 pessoas. Além do mais, o resultado final do trâmite legal gerou controvérsias, pois ocorreram diversas infrações por parte de alguns juízes e desembargadores que, claramente, chegaram a empenhar-se em prol da parte autora, isto é, hastearam verdadeira bandeira em favor da reintegração da propriedade, ferindo o princípio de imparcialidade.
Percebe-se, por último, a prevalência do direito privativo da massa falida e dos credores ao direito social de toda uma comunidade já estabelecida. Destrói-se, além disso, anos de labuta dessas 1.700 famílias que investiram seus poucos tostões na construção e melhoria da residência agora destruída (pois muitas delas até o presente momento não foram incorporadas em programas como o Minha Casa). Sonhos compartilhados, amizades criadas, memórias grafadas foram perdidos ou, quando não, mutilados pela violência com que ocorreu a desocupação, esta ocasionou inclusive mortes. É notório, também, que muitas das famílias tiveram pouco tempo para retirarem seus bens e, em sua maioria, acabaram por perdê-los. Bem, as agressões, usurpações e ofensas foram inúmeras.
Para Marx, o que temos aqui é a óbvia legitimação de uma garantia (a propriedade) da classe preponderante em detrimento da classe oprimida, esta por interferir nos ditames da outra sofre a coerção prevista em lei, senão uma maior. Temos que em teoria, ou seja, de acordo com o disposto no código civil ou na constituição, a situação é ideal, garante-se direitos fundamentais, o princípio da isonomia e garantias sociais, mas na práxis a classe oprimida tende a ser preterida, mesmo quando esta possui mais salvaguardas ou quando é um embate da própria classe contra particulares da outra. O código é ideal, Hegeliano, a prática é real, Marxista.
O que fica claro, enfim, é que não só a teoria Marxista continua pertinente, como o embate entre os direitos de primeira dimensão e os de segunda, ou entre as liberdades individuais e os direitos sociais, continua tão belicoso quanto no século passado, quando estes últimos foram reconhecidos.
Felipe P. Ravasio 1° Ano Direito Diurno.
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