O caso Pinheirinho,
em que o Estado decidiu em favor da Massa Falida de uma empresa, em detrimento
dos moradores de uma comunidade chamada Pinheirinho, concedendo liminar de
reintegração de posse que ocorreu de forma violenta, desproporcional, ferindo
os Direitos Humanos principalmente no cerne da Dignidade da Pessoa Humana,
desrespeitando direitos e garantias constitucionais, violando códigos de ética
e de conduta, atos processuais irregulares e atuação tendenciosa e afastada da
realidade por parte dos magistrados envolvidos, é um retrato fiel de como o
Direito pode tornar-se um instrumento de dominação política e social, servindo
aos interesses econômicos.
A atuação do Direito confere legitimidade na dominação de
uns homens por outros, resguardando tal atuação da ordem jurídica como se fosse
a expressão máxima da liberdade dos homens. Todavia, trata-se de engodo – é
necessário que o homem se liberte dos grilhões teóricos e ilusórios que buscam
justificar a subjugação exercida através do Direito. É possível perceber que a
questão econômica e a luta de classes permeiam a realidade social, explicitada
pela relação de exclusão da comunidade Pinheirinho.
A atuação do Direito no caso Pinheirinho apresenta uma
solução que só é coerente ao nível da imaginação, uma vez que busca compensar
as insuficiências da realidade de desigualdade histórica e material entre as
partes através da argumentação normativa positivista, sem considerar que
atender a essas necessidades teóricas impostas pelo Direito podem não
corresponder as necessidades da sociedade real, e claramente a solução
encontrada, de legitimar uma reintegração de posse violenta não resultou em
atuação justa e prática na resolução do conflito.
Marx tece uma crítica contunde à abstração presente em
Hegel, uma vez que para este a universalidade do direito representa a superação
das particularidades, e por isso, a lei deve se sobressair sobre a vontade
particular. A idealização de Hegel do Direito em sua formalidade é visto por
Marx como algo metafísico e vazio de significado, pois ele não expressaria a
realidade do conflito. Para Marx, o direito não é atemporal e impessoal, a
expressão máxima de uma justiça inquestionável e determinada. A dialética
social de Marx encontra hoje várias outras faces que se opõem e se completam
parcialmente, tornando os interesses de classe difusos e complexos, e isso
enfraquece a capacidade daqueles que estão subjugados de se unirem e constituir
corpo com força suficiente para chegar às revoluções: por isso a sociedade se
contenta com as reformas, os dispositivos paliativos criados pela lei para
aparentar uma diminuição da segregação social, muito embora essas mudanças
superficiais não sejam capazes de eliminar a desigualdade, são insuficientes.
É possível confirmar a crítica de Marx quanto a ideia de que
o Direito é um pressuposto da felicidade, como afirmava Hegel, pois as decisões
judiciais não se traduziram na expressão da vontade racional dos homens,
tampouco os conduziu a felicidade, já que mesmo após recorrer ao direito se
depararam com uma solução que sintetiza o resguardo de interesses econômicos e
a degradação da dignidade da pessoa humana.
A capacidade da classe dominante de se reinventar e de
mobilizar os instrumentais do Direito mostra seu domínio da realidade, como se
observou nas decisões judiciais no caso Pinheirinho: em diversas instâncias o
direito agiu em favor da massa falida, mesmo que para beneficiá-la tivesse que
incorrer em irregularidades processuais, até mesmo passando por cima da decisão
da União. A judicialização da política, e a politização do Judiciário
revelam-se em decisões fracamente sustentáveis como a referida. Negar as
fragilidades do Direito perante as forças políticas, econômicas e até mesmo
midiáticas que o permeiam não contribui para o amadurecimento da concepção do
Direito, bem como da sua interpretação e aplicação por parte dos operadores.
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