A
qualquer momento, a grande indústria cinematográfica pode lançar um novo filme
de ficção científica. Seremos novamente bombardeados por propagandas que aguçarão
nossa curiosidade e ficaremos aguardando ansiosamente pela estreia. Se
possível, no cinema 3D do Shopping X, acompanhado de um combo gigante de pipoca
com manteiga e Coca-cola. Afinal, não há nada melhor para acompanhar o filme
baseado no Best-Seller Y que conta... a história de um homem que foi congelado
na Idade Média e descongelado em pleno Século XXI e tem que se acostumar, além
das mudanças tecnológicas, com as mudanças das tradições, das relações sociais
e da aplicação do Direito??!
Sim,
meus caros, não só em carros voadores e naves espaciais devemos basear as
mudanças previstas para o futuro. Ficção “científica” apenas pelo modo que o
homem atravessou o tempo? Depende do que consideramos como ciência. O fato é
que esse homem, para dar poucos exemplos, não vai aceitar de imediato o seu
direito à propriedade através de contrato – depois que alguma boa alma paciente
o explique o que é um contrato escrito, é claro. Não vai aceitar que sua
palavra vale menos que um papel. Não aceitará que o que restou dos antigos e
tradicionais ritos, que simbolizavam fidelidade (relação de suserania e
vassalagem, por exemplo) foram apenas situações adaptadas a algumas religiões.
Isso sem contar o dinheiro que não tomará emprestado de ninguém, afinal, sua
família já se foi. E, quando for convencido de fazê-lo, não entenderá como não
dará seu próprio corpo em garantia.
Como
podemos perceber, as transformações das relações sociais não aconteceu de
maneira isolada. O Sistema, influenciado por classes dominantes e pelo novo
modo racionalista de pensar, mudou (e muda até hoje). E o Direito também teve
que ser adequado, previamente, uma vez que ele foi e é usado como base para
garantia dos interesses, de acordo com cada sociedade. Weber, talvez até de
forma idealista, tentando trazer a ideia de direitos iguais, diz que as “decisões
jurídicas são a aplicação de uma disposição jurídica abstrata a uma ‘constelação
de fatos’ concreta”, e que, portanto, o direito deveria constituir um sistema sem
lacunas, o que sabemos ser impossível, uma vez que o legislador não consegue abarcar
todas as possibilidades na Constituição.
Além
disso, Weber discute o fato da separação da pessoa física da pessoa jurídica.
Na Antiguidade, a pessoa era “uma única”, que respondia por todos os seus atos
pessoais, de sociedade, jurídicos, políticos e religiosos, sendo que eles se
interligavam. Na modernidade, a pessoa responde por esses mesmos atos, porém um
não é influenciado pelo outro. Aliás, talvez possamos considerar, ao
analisarmos nós mesmos, que até o nosso comportamento se modificou nessa
proporção, uma vez que o adequamos, o adaptamos às diferentes situações em que
nos encontramos: não nos portamos em nossos trabalhos da mesma forma que o
fazemos em nossas casas.
Enfim,
a sociedade e o poder das classes mudaram e modificaram a economia e a política.
E, servindo de base para tudo isso, o Direito mudou. O Direito mudou não apenas
em sua forma prática de proteção de interesses, mas também na forma em que é
visto. Agora visto como Ciência, fomenta o debate não só de seu objeto, como
também de sua função. Percebendo que sua função ainda não é fixa, não
estaríamos justificando possíveis – ou, na verdade, conhecidos – casos de
injustiça?
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