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domingo, 14 de outubro de 2012

A ficção científica que ninguém vê


                


                A qualquer momento, a grande indústria cinematográfica pode lançar um novo filme de ficção científica. Seremos novamente bombardeados por propagandas que aguçarão nossa curiosidade e ficaremos aguardando ansiosamente pela estreia. Se possível, no cinema 3D do Shopping X, acompanhado de um combo gigante de pipoca com manteiga e Coca-cola. Afinal, não há nada melhor para acompanhar o filme baseado no Best-Seller Y que conta... a história de um homem que foi congelado na Idade Média e descongelado em pleno Século XXI e tem que se acostumar, além das mudanças tecnológicas, com as mudanças das tradições, das relações sociais e da aplicação do Direito??!
                Sim, meus caros, não só em carros voadores e naves espaciais devemos basear as mudanças previstas para o futuro. Ficção “científica” apenas pelo modo que o homem atravessou o tempo? Depende do que consideramos como ciência. O fato é que esse homem, para dar poucos exemplos, não vai aceitar de imediato o seu direito à propriedade através de contrato – depois que alguma boa alma paciente o explique o que é um contrato escrito, é claro. Não vai aceitar que sua palavra vale menos que um papel. Não aceitará que o que restou dos antigos e tradicionais ritos, que simbolizavam fidelidade (relação de suserania e vassalagem, por exemplo) foram apenas situações adaptadas a algumas religiões. Isso sem contar o dinheiro que não tomará emprestado de ninguém, afinal, sua família já se foi. E, quando for convencido de fazê-lo, não entenderá como não dará seu próprio corpo em garantia.
                Como podemos perceber, as transformações das relações sociais não aconteceu de maneira isolada. O Sistema, influenciado por classes dominantes e pelo novo modo racionalista de pensar, mudou (e muda até hoje). E o Direito também teve que ser adequado, previamente, uma vez que ele foi e é usado como base para garantia dos interesses, de acordo com cada sociedade. Weber, talvez até de forma idealista, tentando trazer a ideia de direitos iguais, diz que as “decisões jurídicas são a aplicação de uma disposição jurídica abstrata a uma ‘constelação de fatos’ concreta”, e que, portanto, o direito deveria constituir um sistema sem lacunas, o que sabemos ser impossível, uma vez que o legislador não consegue abarcar todas as possibilidades na Constituição.
                Além disso, Weber discute o fato da separação da pessoa física da pessoa jurídica. Na Antiguidade, a pessoa era “uma única”, que respondia por todos os seus atos pessoais, de sociedade, jurídicos, políticos e religiosos, sendo que eles se interligavam. Na modernidade, a pessoa responde por esses mesmos atos, porém um não é influenciado pelo outro. Aliás, talvez possamos considerar, ao analisarmos nós mesmos, que até o nosso comportamento se modificou nessa proporção, uma vez que o adequamos, o adaptamos às diferentes situações em que nos encontramos: não nos portamos em nossos trabalhos da mesma forma que o fazemos em nossas casas.
                Enfim, a sociedade e o poder das classes mudaram e modificaram a economia e a política. E, servindo de base para tudo isso, o Direito mudou. O Direito mudou não apenas em sua forma prática de proteção de interesses, mas também na forma em que é visto. Agora visto como Ciência, fomenta o debate não só de seu objeto, como também de sua função. Percebendo que sua função ainda não é fixa, não estaríamos justificando possíveis – ou, na verdade, conhecidos – casos de injustiça?


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