Certa vez, não inesperada ocasião
Um operador retirou suas luvas,
Rasgou o avental e limpou as suas mãos
Encarou a esteira à sua frente
Deparou-se com os olhares curiosos.
Encontrava-se inquieto
Nunca antes havia sido interpretado.
Em direção à porta, ele despediu-se.
Ao lado do instante do adeus, ficaram para trás
A sua depressão, as engrenagens,
Suas relações de produção,
As noites exaustivas após o expediente,
Seus turnos de dezesseis horas,
Sua segurança e, com ela,
O seu título de legítimo cidadão.
Eles disseram que ele teria o seu nicho
Eles asseguraram que seria feliz e digno
Eles afirmaram... enfim.
Hipóteses já não mais possuíam importância.
Ele ousou almejar existir como o planejado
Em troca, recebeu o extremo contrário:
Inadequação com o sistema.
Ideias e anseios quase o arruinaram.
Contudo, isso não mais aconteceria
Ele, ao ultrapassar a última porta,
Após ter sentido a densidade da poluição,
Tendo enxergado o vermelho acinzentado do anoitecer,
Tendo escutado os rumores do início da vida noturna,
Sentiu os sussurros do vento chamarem-no.
Lembrou-se das suas inclinações anteriores
Ouviu o seu eu do passado sedento por luz.
No âmago do recordar, buscou uma memória.
Queria ser escritor.
Antes que o seu gerente, irremediável e ranzinza,
O pegasse e o sufocasse por ter paralisado a Mecânica
Ele subiu em sua bicicleta, encarou o horizonte e
Partiu em direção à casa de sua mãe.
Naquele dia, pela primeira vez, apresentaria uma novidade:
Ele seria feliz.
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