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domingo, 24 de abril de 2022

O progresso como a conservação do retrocesso

 As ideias que compõe a corrente positivista tiveram sua origem na França e na Inglaterra, em meados do século XVIII, e vale salientar que a escrita de seus principais escritos, feita por Auguste Comte, ocorreu em um período de fervilhamento revolucionário e agitação social, em que a burguesia almejava a hegemonia política e ideológica enquanto a classe operária buscava sua organização social. O movimento positivista continha nos seus principais princípios a aversão ao estado teológico e metafísico, o culto ao empirismo, a ciência e a criação de leis exatas e invariáveis analisando apenas o presente sem se importar com as origens ou o destino final. Por fim, quem imaginaria que os ideais de uma corrente que apresenta a palavra “progresso” na maior parte dos seus lemas e cultua o cientificismo iria causar uma série de retrocesso no que tange à realidade brasileira? 

Em uma simples análise da realidade brasileira é possível identificar ideais positivistas, como por exemplo, a frase que estampa nossa bandeira: “Ordem e progresso”, frase a qual diz respeito a conservação da ordem para se obter o progresso, mas de que maneira se obtém o progresso sem mudanças? Ainda mais quando tudo aquilo que gera mudanças é taxado de anormalidade e subversivo? Peguemos como exemplo o Direito- de que maneira o Direito poderia ser estático? Tendo em vista que o Direito tem a missão de garantir a melhor convivência e suprir as necessidades de uma determinada sociedade, a qual se modifica o tempo todo, manter um Direito estático é o mesmo que aplicar normas que foram feitas para uma sociedade que não existe mais. Sigo com mais questionamentos: o que é a anormalidade? Com base em que valores devemos defini-la? E meu maior e final questionamento o que seria o progresso? O “progresso”, que, infelizmente, vejo ser defendido atualmente, fere a constituição, fere os direitos humanos, promove o ódio, segrega as minorias, causa um movimento retrogrado a direitos que foram conquistados com muito sangue e suor, promove uma moral religiosa universal, não respeita a laicidade e não está aberto a opiniões. Bem, de qualquer forma, não consigo enxergar esse “progresso” sem ser uma das mais cruéis formas de retrocesso. 

Em segundo lugar, Auguste Comte defende que a felicidade está relacionada ao bem blico e não a individualidade, dessa forma, segundo o positivismo, faz-se necessário, o sacrifício dos parâmetros individuais de felicidade em prol da sociedade. Apesar de escrito no século XVIII, se mantém extremamente atual no corpo social brasileiro, em que cada vez mais as pessoas são obrigadas a viverem “aprisionadas” em prol de uma moral construída por valores que são opressores e diferentes dos seus, como por exemplo, pessoas que escondem sua sexualidade, abrindo mão de sua própria felicidade para não afrontar os valores da família ou as milhares de mulheres que vivem em relações abusivas e continuam, mesmo que infelizes, em seus casamentos, uma vez que o divorcio fere a moral e é por muitos considerado um ato subversivo. Portanto, concluo que o positivismo não visa promover a felicidade e sim, cumprir papéis sociais. 

Ademais, outro ponto positivista excessivamente presente na nação verde-amarela consiste no contexto trabalhista, visto que dentro da perspectiva positivista é reforçada a importância da valorização do trabalho, principalmente, no que diz respeito aos atos práticos, além da aceitação de seu papel social sem ter ambições exorbitantes, de maneira mais clara, no meu ponto de vista, em poucas palavras é uma maneira mais bonita de dizer “ Aceite seu emprego, mesmo que seja humilhante e não te propicie uma vida no mínimo digna, afinal, você está cumprindo seu papel social e ajudando a sociedade, e não existe nada mais belo do que isso”. Não há nada que represente mais a sociedade brasileira, já que o maior desespero da elite é ver o filho do porteiro e da faxineira frequentando a faculdade, imediatamente a elite se questiona: “Quem irá ficar na portaria e limpar o banheiro futuramente?”. 

Em suma, os ideais positivistas são extremamente atuais e estão em peso na sociedade brasileira, sem se dar conta de que de tanto buscar o progresso, estamos caminhando, não apenas para o retrocesso, mas também para as ruínas e que da mesma forma que durante o auge da escrita dos princípios positivistas a classe oprimida (classe operária) almejava sua organização social, a classe oprimida da atualidade busca fugir da necessidade de apenas cumprir seu papel social sem possibilidade de mudança ou ascensão e da imprescritibilidade de conservação da ordem e do que é ou era antes. 


Anny Barbosa-1º ano Direito Noturno

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