"Faça-se justiça mesmo que caiam os céus."
O que é o Direito?
Esta questão vem sido debatida por muitos séculos. E a maior
pergunta, que gera incontáveis teses, discussões e teorias, é: o Direito deve
concentrar-se apenas na norma ou não? É basicamente nisto que se baseia o
confronto de ideias entre Friedrich Hegel e Karl Marx. De um lado, há a velha
ideia de que o Direito garante a ordem e evita o caos por meio de regras e
sanções a serem aplicadas no caso do desvio destas; de outro, há a proposta de
que o Direito serviria para legitimar a opressão dos que detêm os meios de
produção e, consequentemente, influenciam o poder. Qual seria, portanto, a
ideologia predominante?
Minha proposição aqui é: a situação não é, de facto, branca ou preta, mas, sim, cinza. A meu ver, não existe uma balança
entre estas duas ideologias em que um lado pese mais do que o outro. Longe
disso, deve e há uma comunhão entre as duas partes. Explico melhor: o Direito
é, indiscutivelmente, a ciência da norma. É o estudo das fontes e dos objetos
das leis e das respectivas sanções. Estas, por sua vez, são ferramentas para
manutenção da ordem e de prescrição dos atos da vida em sociedade. “O mundo é; o Direito dita o dever-ser.”
Todavia, é justamente nesta composição de instrumentos para
a conservação da ordem que se assenta a faceta assistencial do Direito: as
normas devem ser criadas e aplicadas pelo e para o bem-comum; onde há opressão
e vítimas não há Direito. Os princípios nos quais o Direito brasileiro se
assenta garantem que haja uma igualdade entre os que são submetidos a ele, seja
de justiça, de liberdade, de propriedade, etc. Portanto, há, sim, que garantir
a todos os cidadãos seus direitos diversos por meio da norma prescrita, mas
esta só terá seu propósito devidamente efetuado uma vez que esta garantia seja,
de fato, uma verdade.
No caso Pinheirinho, já adianto, a omissão veio por parte do
Executivo da cidade de São José dos Campos. Se tivesse o direito a moradia sido
garantido por meio da construção de casas populares – imagino eu que, além do
terreno pertencente à empresa falida Selecta, houvesse outros terrenos em que a
construção poderia ter sido feita –, não se chegaria ao ponto de uma invasão de
propriedade pelo Movimento Sem Terra, como forma de protesto e de ter seu
direito constitucional supracitado efetivado.
Há quem argumente que o Judiciário concretizou a visão de
Marx sobre o Direito ao reintegrar o direito de posse à sua devida proprietária,
a empresa Selecta, e não declarar como posseiros os que estavam efetivamente
instalados no local. Dessa forma, o Direito é instrumento de legitimação do
poder dos burgueses, que usam as leis como forma de justificar sua opressão.
A meu ver, entretanto, o Direito cumpriu seu dever de
garantir o direito de propriedade e de impedir o caos e a desordem – vale
lembrar, também, que os “barracos” erguidos pelos esbulhadores eram de
segurança e de saneamento precários. É realmente uma lástima que, por um
infortúnio, o meio pelo qual se aplicou o julgamento final de expulsar os invasores,
ou seja, pela violência desmedida dos policiais, converteu-se em uma verdadeira
chacina.
É, portanto, dever do Direito, sim, garantir os direitos fundamentais
de todo cidadão por meio da força da lei. É, também, dever deste, acima de
tudo, observar a realidade na qual está inserido e, a partir disto, criar leis
que abranjam a todos de forma justa e igualitária. E, principalmente, é dever
de todos lutar para que estes direitos e estas leis sejam concretizados e assegurados da
mesma forma.
Hiago A. Cordioli
Para a Crítica da Filosofia do Direito
Período Noturno
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