Para Hegel,
a lei representa a evolução da ideia de liberdade. Com o sistema capitalista o
homem aceita ser submetido ao Direito pois não se submete mais a outro homem;
agora se sente livre e seguro pois o Direito é quem limita as relações. Para
ele, a razão humana em forma de contratos e propriedades faz com que a vontade
e a razão se equiparem.
Marx discorda.
Afirma que o Estado de Hegel é filosofia que não se materializa. Alega que a
teoria só se realiza num povo na medida em que for a realização das suas
necessidades; que só em nome dos interesses gerais da sociedade é que uma
classe particular pode reivindicar a supremacia geral.
Hegel versus Marx. Propriedade versus moradia. Naji Nahas versus MST.
No
famoso caso do Pinheirinho, que começou na primeira década deste século em São
José dos Campos, um imenso lote de terra que pertencia ao grupo Selecta estava
abandonado há anos até que famílias ligadas ao MST ocuparam a propriedade e
passaram a formar ali uma sociedade em que 1700 famílias viviam em harmonia e
plena organização, dando função social ao imóvel abandonado. Acontece que sete
anos após a ocupação, a empresa se manifestou solicitando a desocupação da
propriedade. E então, na decisão judicial, as “preces” foram atendidas. Uma
operação cinematográfica típica de filme policial envolveu mais de dois mil
soldados, helicópteros, bombas de efeito moral e tiros para expulsar brutalmente
as 1700 famílias que habitavam ali. Sem mais nem menos. Passando por cima de
todas as humildes casas, pertences e, principalmente, da dignidade daquelas
pessoas. Pra onde elas irão agora? Como irão viver agora? A Constituição
Federal de 1988 não deveria garantir que esse direito fundamental – de ter um
lar – seja sempre assegurado?
Surge
então o fato de que o direito de propriedade e o direito de moradia sejam
igualmente constitucionais, estando no mesmo nível hierárquico das normas do
Direito brasileiro. O que fazer então quando esses dois direitos se colidem? Conciliação?
Não! Direitos resguardados em ambas as partes? Não! A hegemonia burguesa de fato
fez com que nessa “guerra civil legal” fosse eliminada fisicamente a parcela
daqueles cidadãos que parecem não se integrar no sistema político; permitiu que
uma terra ociosa há mais de década fosse favorecida em relação a direitos como
usucapião e a dignidade da pessoa humana, em relação àqueles que demonstraram
tanto interesse em ter somente uma moradia que aceitaram viver em espaços onde
nem a energia elétrica nem o saneamento básico chegaram; aceitaram criar seus
filhos e vínculos nessa subcondição por sete longos anos.
Acho que
a juíza que determinou a reintegração de posse a Naji Nahas e a expulsão dos
moradores da comunidade do Pinheirinho se apoiou na avaliação hegeliana sobre a
propriedade acima de outros direitos. Sua total parcialidade sobre o caso em
favor da acumulação de capital burguesa é decepcionante para uma aluna de
direito, visto que essa integra parte da magistratura que finge cegueira frente
a problemas tão aparentes quanto à absurda má distribuição de renda do país.
Questiono
então a tal liberdade e felicidade que Hegel jura observar no capitalismo. Será
que não acabamos de encontrar um exemplo onde ainda há a submissão de "um homem
à outro"? Será que se materializa sua filosofia sobre a segurança que o Direito
traz?
É de se
pensar.
Julie Araujo
1º ano Direito - Noturno
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