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terça-feira, 7 de setembro de 2021

Mas que país é esse?

De fato, Tom Jobim não estava equivocado ao afirmar que “o Brasil não é para principiantes”. O país tropical, do futebol, do carnaval, e da “alegria” não é fácil de se compreender. No entanto, assim como estabelece Weber em suas análises, não podemos deixar de realizar uma compreensão interpretativa e crítica acerca da realidade social de um determinado local, incluindo assim, a realidade social brasileira. Segundo o sociólogo, a Sociologia deve se portar como uma ciência da realidade, estabelecendo assim, reflexões criteriosas acerca da concretude. 

Certamente, não é incumbência simples estabelecer o que o Brasil é, no entanto, devemos determinar o que ele não deve ser. Dessa forma, ao seguir as bases teóricas de Max Weber, podemos realizar certas explicações interpretativas da realidade brasileira. Sendo assim, pautarei minhas reflexões na forma como o território nacional constitui suas estruturas democráticas e de Direito. 

Lastimavelmente, não é novidade que vivemos em uma estrutura na qual o Estado serve de manutenção para os interesses de uma classe dominante. A lei, que sempre emana do Estado, permanece, em última análise, ligada à classe dominante, pois o Estado, como sistema de órgãos que regem a sociedade politicamente organizada, fica sob o controle daqueles que comandam o processo econômico, na qualidade de proprietários dos meios de produção. 

Ademais, ao constatar que o Brasil se enquadra entre um dos maiores produtores de alimentos do mundo, destaque mundial na exportação de diversos gêneros alimentícios, promovedor do agronegócio, mas que possui uma enorme parcela da população passando fome, pode-se concluir que de fato, nesse mísero país, não só as leis são feitas para os “grandes”, mas a vida também. Como compreender um país possui fartura de alimento, mas que continua deixando milhares de pessoas sofrer a amargura da fome? 

Além disso, quando o Ministro da Educação de um governo, seja qual for, declara que a “educação, na verdade, deve ser para poucos”, pode-se concluir que a população desse país não está vivendo um estado de Direito. Para mais, quando esse mesmo Ministro afirma que “estudantes com deficiência atrapalham outros alunos”, torna-se lamentável dizer que as estruturas democráticas e de Direito se encontram, total ou parcialmente, corrompidas nessa sociedade.

No momento em que esse texto está sendo produzido, muitas mulheres brasileiras foram abusadas, violentadas psicologicamente, menosprezadas, inferiorizadas e mortas. O país tropical, do futebol e da alegria massacra covardemente as mulheres a cada minuto, hora e dia. Mas que país é esse? O feminicídio brasileiro é uma realidade, negá-lo é não somente um claro sinal de limitação intelectual, como um retrocesso para se construir medidas eficazes de exterminar essa atitude repugnante do país.

O negro, por exemplo, é outro indivíduo que não possui seus direitos protegidos no país. A música brilhante de Racionais MC’s evidência bem isso ao mencionar que “60% dos jovens de periferia sem antecedentes criminais já sofreram violência policial. A cada quatro pessoa mortas pela polícia, três são negras. Nas universidades brasileiras apenas 2% dos alunos são negros. A cada quatro horas um jovem negro morre violentamente em São Paulo. Aqui quem fala é Primo Preto, mais um sobrevivente”. Sem dúvidas, o negro não vive no Brasil, ele sobrevive.

O Brasil é um país em que os indivíduos conseguem se juntar para disseminar o ódio contra uma criança de 10 anos que foi estuprada desde os seus 6 anos de idade (é claro que isso não é particular do brasileiro. Sinto que existem pessoas, em todos os lugares do mundo, que sentem prazer em propagar o ódio). Como compreender essa realidade? Como não se angustiar diante de uma concretude dessas? 

Diante de todos esses fatos que acontecem constantemente no território nacional, pode-se referir que o Brasil é: um país onde as leis e o Direito é feito para as classes dominantes, e o Estado é usado como meio político e econômico para que essa classe consiga inserir seus interesses na estrutura social. Além do mais, o Estado, em sua posição privilegiada deseja convencer a todos de que cessaram as contradições e, que o poder atende ao povo em geral e tudo o que vem dali é imaculadamente jurídico, não havendo Direito a procurar além ou acima das leis.

Certamente, para Weber, meus escritos, se eu fosse uma socióloga, seriam equivocados, tendo em vista que o autor menciona que não cabe ao cientista social emitir juízo de valor sobre aquela realidade que está sendo investigada. Contudo, pauto-me nos escritos de um grande jurista brasileiro – Roberto Lyra Filho. Este escritor proclama que “não adianta ver que “o mundo está errado” e encolher os ombros, fugindo para algum “paraíso artificial”, no porre, no embalo, no sexo obsessivo ou na transferência de qualquer atuação positiva para mais tarde, noutra vida, no “além”, é preciso realizar um processo de conscientização”.  

Torna-se plausível fazer um adendo de que Weber não estabelecia que a realidade social não deve ser modificada, contudo, este autor mencionava que a transformação do mundo não é papel da ciência e sim da política. No entanto, como converter a realidade social brasileira por meio da política se nossas estruturas organizacionais estão corrompidas? De fato, a política possui um enorme poder de renovação, mas não podemos nos esquivar de utilizar de todos os meios necessários para construir uma nova realidade no país. 

Assim, pode-se reiterar que compreender o que o brasil é não é simples nem instantâneo, requer reflexões criteriosas. Contudo, podemos ter uma clara distinção do que o Brasil não pode e não deve ser. Primeiramente que o Direito brasileiro deveria abarcar o todo e não somente uma classe. Além disso, as estruturas jurídicas de um Estado devem estar organizadas para atender as necessidades mais intrínsecas da população, como a vida, saúde, educação, lazer, dentre ouros. Sendo que não basta estar positivado, o Estado devem ser um mecanismo de ação social e garantir todos os direitos previstos na Constituição. O Estado deve ser, acima de tudo, um promovedor de garantias asseguradoras da dignidade de todos os indivíduos e não uma estrutura de sustento para classes dominantes. 


LÍVIA GOMES - 1° PERÍODO - NOTURNO


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