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segunda-feira, 10 de agosto de 2020

Durkheim e o mito da beleza

 Émile Durkheim foi um importante sociólogo no séc XIX que inspirou diversos estudos sobre a sociedade e como ela se configura. Um desses estudos foi sobre os fatos sociais e como eles influem na vida do individuo, com o objetivo de manter a ordem social.

Os fatos sociais são independentes do individuo, e tem como essência o agir do homem em sociedade de acordo com as regras sociais, ou seja, consiste em maneiras de agir, de sentir e de pensar, obrigando-os a se adaptar às regras da sociedade onde vivem.
Nem tudo é considerado um fato social, pois, para ser identificado como tal, tem de ter uma generalidade, se impondo sobre os indivíduos, uma exterioridade, ou seja, já estava estabelecido na sociedade antes do nascimento do individuo, e coercitividade, agindo sobre todas as pessoas, e não somente uma exclusivamente.
Analogamente as ideias de Durkheim, podemos fazer uma relação desses fatos sociais com a forma que a sociedade no século XXI se organiza, onde diversos mecanismos são elaborados para que os fatos sociais sejam obedecidos. Um exemplo disso é o atual padrão de beleza, criado para manter a ordem e o controle sobre as mulheres, que com a ajuda das empresas de cosméticos e todo o aparato capitalista focado no lucro, inventaram diversas ''regras'' e ''características'' que a mulher ideal deve seguir para ser socialmente aceita.
O padrão de beleza é algo convencionado, que já sofreu diversas mudanças em seus paradigmas durante os anos, mas atualmente o principal esteriótipo que é imposto as mulheres como ideal de beleza, é o da mulher magra.
Essa crença de que a mulher magra é a mulher certa, e a única capaz de ser considerada ''bela'', despertou em diversas mulheres, uma serie de problemas de saúde mental e física, já que em função disso é cada vez mais normal que a mulher se disponha a participar de dietas rigorosas e cirurgias estéticas que podem suscitar complicações em seus corpos, antes saudáveis, somente para se enquadrar nesse padrão inventado.
No livro ''Mito da beleza'' de Naomi Wolf, é discutido como a busca por essa beleza convencionada, que se torna cada dia mais irreal e inalcançável, não é uma necessidade de manter as mulheres magras, mas sim, de manter as mulheres com uma personalidade passiva, ansiosa e emotiva, já que como os pesquisadores J. Polivy e C. P. Herman concluíram em seus estudos '' a restrição calórica prolongada e periódica resulta nessa personalidade característica''. Além disso uma mulher se mantém preocupada com seu corpo ou sua alimentação durante horas, não tem tempo de questionar os paradigmas sociais, portanto o mito da beleza é só mais uma forma de manter a ordem, tanto prezada pela sociedade descrita por Durkheim.
Segundo o filosofo, a resistência a esses fatos sociais é seguida de uma ação punitiva para evitar a ''anomalia'', que seria a deterioração das regras que mantém a coesão social, no caso do mito, a principal punição para essas mulheres é a ideia de que, se não estiverem no padrão, se não forem consideradas bonitas, elas não são merecedoras de amor, ou de sexo, apenas mulheres bonitas são desejadas, o que na realidade é somente mais uma invenção, a beleza nunca esteve ligada a esses fatores. Assim o crime (que seria a não submissão aos padrões) e a punição (a negação de amor) não são proporcionais, mas o que interessa, como alega Durkheim, é como essa punição individual ecoa pelos indivíduos, quando vemos uma mulher fora dos padrões, e que está solteira, nos é contado que este fato está estritamente ligado a sua aparência, fazendo com que todos acreditem nisso, inclusive ela.
A prova de que essa questão está ligada com a natureza política é de que, se esta fixação sobre aparência estivesse relacionada ao sexo, ela seria uma questão íntima entre a mulher e seu, ou sua, parceira, se estivesse relacionado à saúde, seria uma questão da mulher consigo mesma, mas não, a aparência da mulher é discutida de forma pública, nas revistas, na TV, e na mídia em geral, isso tudo faz parte de uma estratégia de controle muito bem pensada.
Uma grande diferença entre o positivismo de Comte e a filosofia de Durkheim é que Durkheim não acreditava que isso nos guiaria involuntariamente para o progresso da sociedade, e nesse caso ele estava certo, essas medidas de controle com o objetivo de erradicar esses perigos trazidos pela liberação das mulheres, só nos atrasa, e aprisiona, tirando nosso direito sobre nossos próprios corpos.



Bibliografia:
WOLF, Naomi. Mito da beleza. versão brasileira: Rio de Janeiro: Rocco 1992

Citação retirada do livro base citado acima.
J. Polivy e C. P. Herman: “Clinical Depression and Weight Change: A Complex Relation”, Journal of Abnormal Psychology, vol. 85 (1976), p. 338–340. Citação em Ilana Attie e J. Brooks-Gunn, “Weight Concerns as Chronic Stressors in Women”, em Rosalind C. Barnett, Lois Biener e Grace K. Baruch, orgs., Gender and Stress (Nova York, The Free Press, 1987), p. 237.

Talita Bravo 1 Ano de Direito Matutino

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