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domingo, 6 de novembro de 2011

O Direito Na Contemporaneidade: Sacralização E Dessacralização

"Com intensidade muito diversa, a dominação de um direito sacro de uma criação de direito sacra penetrou nos territórios geográficos e áreas específicas do direito, e depois foi expulsa deles. Deixamos aqui de lado o interesse específico, originalmente motivado por normas puramente mágicas, do direito sacro em todos os problemas de castigo e expiação, bem como seu interesse, a ser examinado noutro contexto, no direito político e, por fim, as normas também originalmente condicionadas por idéias mágicas, referentes aos tempos, lugares e meios de prova permitidos pelo direito sacro para o procedimento, para examinar quase exclusivamente a área do 'direito civil', no sentido habitual. Nesta área, os princípios referentes à licitude e às consequências do matrimônio, o direito familiar e o direito de sucessão, que por sua natureza faz perte deste, eram o domínio principal do direito sacro: tanto na China e na Índia quanto no las romano, na schari'a islâmica e no direito canônico da Idade Média. As antigas proibições mágicas do incesto eram antecessoras do controle religioso do matrimônio. A importância dos sacrifícios válidos aos antepassados e de outros sacra da família juntou-se a esse complexo e condicionou a interferência do direito sacro no direito familiar e de sucessão. No âmbito do cristianismo, onde os últimos interesses, em parte, deixaram de existir, o interesse fiscal da Igreja na validade dos testamentos atuava então no sentido da conservação do controle do direito de sucessão. As normas religiosas referentes aos objetos e às localidades destinados a fins religiosos, sacros ou (ao contrário) vedados por um tabu mágico, podiam primeiro entrar em conflitos com o direito mercantil profano. Na área do direito contratual, o direito sacro interferia por razões formais quando - o que ocorria com muita frequência e, originalmente, ao que parece, com regularidade - era escolhida uma forma de obrigação religiosa: por exemplo, o juramento. Isso ocorria por razões materiais quando estavam em questão normas compromissórias da ética religiosa - por exemplo, a proibição da usura". (Max Weber).
"A religião oficial do Irã é o Islã duodecimano da escola Ja'fari, e este princípio permanecerá eternamente imutável. A outras escolas islâmicas é concedido o pleno respeito, e seus seguidores estão livres para agir de acordo com sua própria lei na realização de seus ritos religiosos. Estas escolas gozam de estatuto oficial em assuntos relativos à educação religiosa, assuntos de caráter pessoal (casamento, divórcio, herança e testamentos) e litígios relacionados em tribunais de justiça. Em regiões do país onde os muçulmanos que seguem qualquer uma destas escolas constituirem a maioria, a legislação local, dentro dos limites da jurisdição de conselhos locais, deve estar de acordo com a respectiva escola, sem infringir os direitos dos seguidores de outras escolas".(Constituição da República Islãmica do Irã, art. 12)."Todos os habitantes do Reino têm o direito de exercer livremente a sua religião. A religião Evangélico-Luterana permanecerá a religião oficial do Estado. Os habitantes que a professam devem instruir os seus filhos na mesma".(Constituição do Reino da Noruega art. 2). "Nós, representantes do povo brasileiro, reunidos em Assembléia Nacional Constituinte para instituir um Estado Democrático, destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias, promulgamos, sob a proteção de Deus, a seguinte CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL". Constituição da República Federativa do Brasil, Preâmbulo.
O vínculo entre a religiosidade e o ordenamento jurídico é, há não pouco tempo, motivo de inúmeras discussões. A inexistência de fronteiras entre o Direito e o sagrado caracterizou, indistintamente, as mais remotas civilizações. Com efeito, as sociedades sumeriana, acadiana e egípsia eram todas teocracias governadas por déspotas cultuados pelo povo. A relação entre as classes sacerdotais e os monarcas era de grande solidez. A Grécia Antiga inovou, por sua vez, ao intentar a separação entre o político e o religioso. Roma, contudo, não levou a cabo tal negócio. Aliás, o chefe de governo romano possuia a alcunha de "sumo pontífice". No Medievo, a tradição romanística de miscibilidade entre o sagrado e o político apenas aprofundou-se: parte significativa da filosofia política ocupava-se na tentativa de distinguir o "poder temporal" do "poder espiritual". A Modernidade trouxe consigo a recuperação, ainda que tímida, do ideal grego de separação entre os aludidos poderes. Todavia, a Revolução Francesa é que foi responsável por disseminar e concretizar esta idéia de cisma. No século XIX, não poucos pensadores acreditavam que um Direito plenamente dessacralizado estava por nascer. Dentre eles, Max Weber defendia que o processo de ininterrupta racionalização, impositor de um Direito sistematizado com normas gerais e abstratas, aliados ao sistema capitalista teriam como consequência, gradativamente, o surgimento de ordenamentos jurídicos de facto dessacralizados. Destarte, tenderiam a desaparecer os Estados teocráticos e de religião oficial, restando tão somente os laicos. Cumpre salientar, entretanto, que o sagrado ocupa, na atualidade, espaço no Direito, embora menor que outrora. Dezenas de países são influenciados decisivamente pela religiosidade, sejam eles Estados teocráticos (e.g. Irã), sejam Estados com religião oficial (e.g. Noruega, Reino Unido, Argentina, Arábia Saudita, Sudão, etc.). Estados oficialmente laicos vêem, frequentemente, sua laicidade questionada, já que a influência religiosa se faz presente além do que se espera. A busca por uma total separação, contudo, permanece, sendo tomadas, contemporaneamente diversas medidas, ainda que não raro acanhadas. A República da França suscitou, recentemente, acalorado debate acerca da separação entre o sagrado e o político: ao proibir o uso da burca islâmica em repartições públicas estaria provando laicidade ou islamofobia? A segunda opção parece ser a escolhida pela muçulmana da imagem.

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