Durante séculos, o mundo conviveu com a prevalência do sentimento concreto, estimulado por convicções éticas e/ou religiosas, em detrimento da racionalização do direito. Neste contexto, as normas religiosas eram muito mais presentes e o governo do Estado estava, basicamente, pautado nelas. Utilizando-se apenas de normas religiosamente sagradas, alguns tipos de liderança política, a depender do caráter da dominação, eram alheios a quaisquer outros limites capazes de restringir seu poder, como, por exemplo, as normas advindas de um formalismo abstrato. Assim, embora o sagrado ocupasse um espaço exponencial, não apenas nos cenários político e jurídico da época, mas nos diversos aspectos da sociedade, e exercesse grande influência na conduta dos indivíduos, sua presença contribuía para a livre ação do governante, podendo este exercer o poder de forma absoluta.
No direito atual, o sagrado ainda se faz presente, no entanto, o espaço ocupado por ele é mínimo em comparação a sua significativa influência de outrora. Faz-se presente, sem dúvida, uma vez que os profissionais do direito, pessoas como todas as outras, que possuem suas crenças e convicções, influências culturais, morais e religiosas, por mais que primem pela imparcialidade, não conseguem se desvincular, por completo, de certos valores que lhes são intrínsecos. Em contrapartida, no atual estágio de racionalização em que se encontra o direito, com a codificação das normas jurídicas e com sua abstração, os indivíduos passaram a ter muito mais liberdade, pois se tornaram menos dependentes em relação à dádiva e ao poder arbitrário do governante.
Cumpre ressaltar que o espaço do sagrado no direito, até mesmo nos dias atuais, depende, substancialmente, da forma como as diversas sociedades estão organizadas. Tomando como exemplo o Brasil e outros países do ocidente, onde há prevalência do cristianismo, pode-se dizer que o jurídico, assim como o cenário político, está desvinculado de crenças e dogmas religiosos de maneira significativa. No entanto, se os exemplos forem outros, como países nos quais há a predominância do islamismo ou do judaísmo, percebe-se que, sobretudo no que tange à política interna, o Alcorão e a Torá, respectivamente, são capazes de exercer maior influência do que as normas jurídicas. Acrescenta-se ainda que tais normas, elas próprias, podem apresentar vestígios da influência religiosa. Nestes casos, as tradições sagradas, ainda hoje, dominam a esfera jurídica.
Sendo assim, é inegável que o espaço do sagrado no direito atual é muito menor do que o ocupado por ele há séculos atrás. Mas, não se pode esquecer da influência ainda presente em países, nos quais o político e o jurídico permanecem atrelados às tradições religiosas.
Nenhum comentário:
Postar um comentário