Não há duvida de que a
conturbada trajetória socioeconômica do Brasil contribuiu para a construção de
um cenário político extremamente caótico. Na atual conjuntura, produto direto
das controvérsias que cercaram a história brasileira, fica claro o predomínio
de uma intensa polarização maniqueísta entre alas de esquerda e direita, cujo constante
conflito transforma qualquer debate em uma fervorosa guerra de interesses.
Nesse sentido, a busca de apoio político, que se dá através da manipulação de
massas populares, torna-se fundamental para a perpetuação dos poderes
partidários. Essa demagogia, entretanto, evidencia-se vazia de qualquer
proposta real de mudança, visto que ambas as partes do espectro ideológico preocupam-se
mais com a manutenção de seu nicho eleitoral do que discutir qualquer tipo de
pauta que minimamente ameace sua aprovação popular.
Tal fenômeno, percebido com clareza em nosso
país, é identificado pela análise de Ingeborg Maus como uma espécie de
“Infantilismo político”. Segundo a filósofa alemã, as exigências em questões
como justiça social e proteção ambiental aparecem com pouca frequência nos
comportamentos eleitorais, que, aplicados unicamente à busca por votos, acabam
por renegar a consideração de transformações necessárias para a sociedade.
Dessa forma, Maus também indica que a esperança de realização dessas mudanças
significativas acaba sendo projetada nas decisões do judiciário, o qual, assim,
ganha cada vez mais importância.
Como exemplo dessa crescente importância do
judiciário, é pertinente a observação do recente caso envolvendo a discussão da
adoção do sistema de cotas pela Universidade de Brasília. Em processo ajuizado
no Supremo Tribunal Federal, a ação movida pelo partido DEM pretendia acabar
com o sistema de cotas instaurado na UnB, acusando-o de criar um “tribunal
racial”. A decisão final do julgamento, conforme a tendência judicial explicada,
ficou encarregada aos ministros do STF, que, por unanimidade, corretamente
decidiram pela constitucionalidade das cotas raciais. Outrossim, é cada vez
mais evidente a ocasião de situações como a citada, em que questões de grande repercussão
politica estão sendo decididas por órgãos do poder judiciário, ao invés das
instancias tradicionalmente responsáveis por essa tarefa: o Congresso
Nacional e o Poder Executivo.
Profundamente influenciado pelo advento da
constituição federal de 1988 e pela consequente redemocratização brasileira,
tal é o processo de Judicialização do sistema brasileiro, que, motivo de grande
controvérsia, é acusado por muitos de politizar a justiça e não respeitar as
regras democráticas. Sabe-se, entretanto, consoante ao que argumenta Luís
Roberto Barroso, que a Judicialização é uma consequência necessária, não um
exercício deliberado de vontade política. Decidindo porque é o que lhe cabe
fazer, sem alternativa, o judiciário acaba funcionando como um fórum de
princípios, velando pelas regras do “jogo”, mesmo que contra a vontade circunstancial
de quem tenha mais votos. Nesse diapasão, percebe-se a profunda importância dos
efeitos do judiciário sob a sociedade, os quais, muitas vezes clamados como
ganhos da esquerda ou da direita, são, na verdade, conquistas do Direito e da
Jurisprudência.
João Manuel Pereira Eça Neves Da Fontoura - Turma XXXV Noturno
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