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domingo, 27 de maio de 2018

Judicialização: instrumento integrador da sociedade


“Tem significado de diagnóstico a Constituição ter alargado o exercício da democracia. É o clarim da soberania popular e direta tocando no umbral da Constituição para ordenar o avanço no campo das necessidades sociais."
(Discurso do presidente da Assembleia Nacional Constituinte, Dr. Ulysses Guimarães, em 5 de outubro 1988)

QUANTO A JUDICIALIZAÇÃO
Judicializar uma matéria é nas palavras do Ministro Luís Roberto Barroso “transformar Política em Direito”. Nos últimos anos temos visto, de forma cada vez mais frequente, o ativismo do Poder Judiciário nas decisões políticas brasileiras, ao invés das instâncias políticas responsáveis por tal tarefa. Ainda de acordo com Barroso, a Judicialização é “um avanço da justiça constitucional sobre o espaço da política majoritária, que é aquela feita no âmbito do Legislativo e do Executivo”.

Tal processo se dá por diversos motivos, como a redemocratização do espaço político brasileiro. Com fim da Ditadura Militar, há o fortalecimento do Poder Judiciário, que recupera as garantias de legitimidade da magistratura; o transforma em um verdadeiro poder independente, constituindo a esfera dos 3 poderes da República e concede a ele a signa de “guardião da constituição”.

Soma-se ao processo a reestrutura o Ministério Público, garantindo autonomia e possibilitando a atuação em ações civis públicas, e a criação de Defensoria Pública. Em suma, aumentou o Poder Judiciário e consequentemente a demanda por justiça.

Outro fator imprescindível é o texto constitucional com teor abrangente. A Constituição Federal como manifesta o preâmbulo assegura “exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça”. Portanto tem caráter amplo e passivo de discussão de qualquer matéria.

Além do mais, e como ponto chave a respeito da Judicialização, o sistema de controle de constitucionalidade brasileiro é, de igual forma, abrangente. Isso possibilita, deixar-se de aplicar uma lei, desde que inconstitucional, ou, recorrer ao Supremo Tribunal Federal, para que esse, na figura de “guardião da Constituição”, norteie a ação e traga a matéria para a seguridade jurídica.

Portanto, toda a vez que Poder o Judiciário manifesta-se a respeito de uma matéria é por que este foi provocado e cabe a ele tal missão, já que isso lhe foi atribuído. Entretanto, o que confere à Judicialização caráter polêmico é o Ativismo Judicial.

Nas Palavras de Barroso Ativismo Judicial é

“uma atitude, a escolha de um modo específico e proativo de interpretar a Constituição, expandindo o seu sentido e alcance. Normalmente ele se instala em situações de retração do Poder Legislativo, de um certo descolamento entre a classe política e a sociedade civil, impedindo que as demandas sociais sejam atendidas de maneira efetiva.
Contudo, como expressa no trecho do Ministro, não é em Ativismo Judicial em si o problema- Tenha vista que dá ao interprete a possibilidade de uma interpretação mais abrangente afim de atender as demandas sociais. É a linha tênue interpretativa do exegeta que pode transpor para um abuso de poder e também sua ação que se intromete na função de outro poder.

QUANTO AOS RISCOS DA LEGITIMIDADE DEMOCRÁTICA
O primeiro risco vai na direção da legitimidade dos agentes do Poder Judiciário em sobrepor-se uma decisão oriundas dos Poderes Legislativo ou Executivos, visto que, os agentes do judiciário, diferente dos deputados, vereadores , senadores, prefeitos , governadores e presidente , não são eleitos. Entretanto, o modelo constitucional brasileiro deliberou ao Judiciário tal atuação. Portanto, não parte de uma vontade, mas de uma consequência e segundo Barroso “Ao aplicarem a Constituição e as leis, estão concretizando decisões que foram tomadas pelo constituinte ou pelo legislador, isto é, pelos representantes do povo”.

Ainda, acredita-se que o Direito pode tornar-se política, pois de acordo com Carl Schimtt, “a pretensão de judicialização da política iria se perverter em politização da justiça”. Contudo, Direito e Política estabelecem uma relação de mão dupla, da política emana o ordenamento e constitui o objeto do Direito, este por sua vez, age em aplica o ordenamento em conflitos e corrige as irregularidades - até mesmo quando parte da política- sempre em sintonia com as relações sociais.

Soma-se a isso os limites do Judiciário. O arranjo institucional democrático brasileiro decorre da separação dos três poderes e a cada um cabe uma função. Quando há divergência interpretativa de normas cabe ao Judiciário a tomar a pauta e aplicar o Direito. Contudo quando o Poder Judiciário insere-se em outro poder e assume suas funções, este fere seus limites e causa abalos no sistema democrático.

QUANTO AS COTAS
Exemplos emblemáticos oriundos da Judicialização de matérias que poderiam ser trilhadas por outros poderes são vários, entretanto foram pautados e definidos pela Poder Judiciário. O que torna o processo mais plural e dá à matéria um fim, como o da interrupção da gestação no caso de anencefalia - após ouvir diversas instituições pró e contra a interrupção da gestação o STF declarou em sentido da legalidade do ato. Ou torna o processo mais rápido, como o do, sempre recorrente, setor da saúde, que se dirige em sentido na obrigação do Estado em garantir a medicação de alto custo aos mais necessitados, ou acelerar e disponibilizar a distribuição.

Entretanto, é também odos casos dos setores de saúde que partem os exemplos negativos da Judicialização. De acordo com o Ministro Barroso
“Ao lado de intervenções necessárias e meritórias, tem havido uma profusão de decisões extravagantes ou emocionais em matéria de medicamentos e terapias, que põem em risco a própria continuidade das políticas públicas de saúde, desorganizando a atividade administrativa e comprometendo a alocação dos escassos recursos públicos”

No ano de 2012 foi a vez das cotas raciais da UNB serem motivos de Arguição de Descumprimento de Princípios Fundamentais recorrido pelo Democratas ao STF. Entretanto, por uma análise puramente sociológica, sem pretensão de argumentos constitucionais-exceto quando na visão de algum autor- torna-se claro a função da Judicialização, quando bem exercida, é garantidor da democracia.

Enquanto o Democratas alegava que inserir cotas raciais era promover o racismo e na Constituição se reprova tal ato, o Judiciário responde a adoção de ações afirmativas, além de reverter os preconceitos raciais que causam impacto na estrutura social, constituíam importante contribuição às políticas públicas de promoção à cidadania por sinalizarem direitos constitucionais da coletividade que foram relegados às margens da dignidade humana.  E que, é obrigação e dever moral, ético e constitucional do Estado agir de modo próprio, ainda que de forma extraordinária e excepcional, para a equalização das oportunidades.

Enquanto havia a alegação de inconstitucionalidade do princípio da IGUALDADE, o Judiciário responde que
“a intenção de dar-se um tratamento mais favorável a quem está em situação de desvantagem, em razão de serem grupos débeis econômica e socialmente, não caracteriza arbítrio ou violação do princípio da igualdade, pelo contrário, pretende viabilizar a isonomia material”.
E também que o princípio da ISONOMIA  é
“cerne da democracia. Tem que haver igualdade de possibilidades: O que não se admite é a desigualdade no ponto de partida, que assegura tudo a alguns, desde a melhor condição econômica até o melhor preparo intelectual, negando tudo a outros, mantendo os primeiros em situação de privilégio, mesmo que sejam socialmente inúteis ou negativos

Portanto, a Judicialização, quando bem aplicada, é parte integrante do sistema democrático e é instrumento integrador da sociedade.

MURILO MARANGONI
Aluno da XXXV Turma de Direito – Unesp Diurno
Franca 27 de maio de 2018.

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