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segunda-feira, 27 de março de 2023

 

Poucos temas ocuparam mais o pensamento ocidental do que a questão gnosiológica - sobre o que realmente sabemos e podemos de fato saber. Nesse sentido, merece especial destaque o personagem mitológico de Prometeus que tipifica a obstinação humana em compreender aquilo que só aos deuses caberia entender e ao homem sujeitar-se, e as consequências que acompanhariam esse processo.

Na figura de pensadores como Bacon e Descartes, a Idade Moderna incorpora esse espírito de Prometeus, lançando um ousado projeto epistemológico de reconstruir o edifício do conhecimento humano deteriorado pelo o que Descartes apontaria como verdades que se pretendiam objetivas mas que exigiam aceitação subjetiva (dogmas).

A essas mesmas verdades, Bacon chamaria de “Ídolos” e as colocaria como um impedimento para se formular conhecimentos autenticamente sólidos e universalmente válidos. Logo, romper com esses ídolos já naturalizados em nossa consciência e impedir a formação de outros novos seriam os objetivos desse projeto moderno, o qual culminaria na criação e adoção do modo de pensar científico e metodológico.

Assim, os novos adeptos da invenção moderna, a saber, Ciência, não mais se sujeitariam as interpretações dogmáticas do mundo e dos fenômenos, fossem eles de ordem natural ou social. Nesse contexto, um novo olhar é lançado para o mundo, não mais como um mistério pertencente aos deuses e sim como um campo aberto à investigação e intervenção dos homens. Contudo, como expõe o Mito de Prometeus, a busca pelo entendimento do mundo também exige um preço que defronta todo aquele que escolhe empreendê-la: a descentralização do eu em relação ao mundo.

Em outras palavras, para entender a amplitude e complexibilidade do mundo circundante é preciso ir mais além da reconfortante subjetividade do indivíduo e do grupo, admitindo-se como parte, e não centro independente, de uma vasta e surpreendente cadeia de relações naturais, históricas e sociais que não pode ser plenamente apreendida pela noção particular de um ou dois indivíduos. Dessa maneira, embora possivelmente nem mesmo o olhar científico possa abarcar toda a magnitude do mundo natural e social, ele representa indubitavelmente uma proposta promissora nesse sentido tanto reconhecendo quanto procurando entender do modo mais objetivo e verossímil possíveis essas intrincadas relações, abandonando uma compreensão simplista, parcial e torta da realidade proporcionada muitas vezes pelos preconceitos, opiniões e maus hábitos de pensamento oriundos de uma interpretação da realidade pautada exclusivamente em impressões subjetivas e não metodológicas.

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