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domingo, 27 de outubro de 2019

A Lei de Diretrizes e Bases da Educação define que, em nome da liberdade de consciência e de crença, há o direito de o aluno ausentar-se de prova ou aula caso ocorram em dias em que vedado o exercício de tais atividades, segundo preceitos de sua religião (Art. 7º-A, caput); indica que no ensino religioso, expressamente facultativo, deve ser assegurado o respeito à diversidade cultural religiosa do Brasil, sendo vedadas quaisquer formas de proselitismo (art. 33, caput); e, por fim, manda que seja ouvida a entidade civil, constituída pelas diferentes denominações religiosas, para a definição dos conteúdos do ensino religioso (art. 33, §2°). Antes de analisar como interagem a doutrina a respeito dos Direitos Humanos e a posição do STF ao julgar improcedente a ADI que tinha como objeto a referida lei por conta destes dispositivos, nota-se que o texto legal, tecnicamente, de forma alguma confronta a constituição, visto que indica a natureza facultativa do ensino religioso, assim como o dever de ser respeitada a diversidade cultural religiosa e ouvida a entidade civil, visando participação plural dos interessados no ensino religioso. Se na prática os dispositivos eventualmente sejam desvirtuados ou, no mínimo, ineficazes na intenção de garantir a pluralidade, devem ser impugnados os atos das autoridades responsáveis nesse contexto. Além disso, por conta de confusão conceitual, costuma-se apontar a qualquer conduta por parte do Poder Público que esbarre em questão religiosa como violação ao princípio do Estado Laico, tal como deveria ser cobrado de um Estado Ateu; se neste oficializa-se a descrença, naquele respeita-se e não se opõe às manifestações religiosas em geral, criando formas de promover essa liberdade, na mesma linha da proteção ao livre exercício de cultos religiosos e garantia de proteção aos locais de culto e suas liturgias (art. 5°, VI, CF). A postura do Poder Judiciário frente à questionada inconstitucionalidade, representada pela decisão do STF na decisão da ADI 4439, vai de encontro com as reflexões de Boaventura de Sousa Santos em seu artigo “Direitos Humanos: o desafio da interculturalidade”. O autor, ao explanar aspectos históricos e diferentes categorias de globalizações que entende existirem, destaca a origem e os fundamentos universalizados do viés de Direitos Humanos defendido pelo Ocidente. Fato é que a Carta da República é pautada em fontes universalizadas, implicando constante perda de identidade, entre outros prejuízos. Apesar disso, não se discutiu a legitimidade dos valores eleitos pelo Constituinte, mas a contrariedade da Lei de Diretrizes e Bases da Educação frente a esses valores eleitos. O alvo da ADI foi a vinculação do papel educativo do Estado, em sua vertente religiosa, ao cristianismo, quando deveria apresentar, de acordo com o requerente, abordagem diferente, analisando a incompletude de cada religião (ideário convergente com a Hermenêutica Diatópica de Sousa Santos), com conteúdo neutro e meramente descritivo das crenças diversas. A proposta é materialmente inviável, visto que impossível esgotar a pluralidade de crenças e cultos (resultando em inevitável exclusão de algum) além de ferir, como uma forma de censura, a liberdade daqueles que, seguros com a própria crença - qualquer que seja, desejam receber os ensinamentos. Por esse motivo é prevista a figura da entidade civil, composta por diferentes denominações religiosas para a definição dos conteúdos do ensino religioso; sendo o instituto que viabiliza a representação da pluralidade religiosa e concretiza a demanda social por diferentes conteúdos de ensino. Por conta disso, reitera-se que o problema não reside na lei em tese, mas na forma como é aplicada: não é necessário acionar o judiciário visando declarar inconstitucionais dispositivos que tutelam a liberdade religiosa, mas suficiente exercitar o direito de representação e, caso negligenciado, denunciar a omissão do Estado.

Gabriel Nagy do Nascimento 3ºano Direito Noturno

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