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sábado, 25 de agosto de 2012

A Ferro e Fogo


                Séculos atrás, a sociedade europeia vivia sob uma atmosfera de constante medo e pudor sustentados pela alienação e pela mentalidade cristã arraigada na coletividade. É incontável o número de vítimas dessa era que tiveram suas vidas corrompidas ou mesmo cruelmente retiradas por penas agonizantes e, o que é pior, amparadas pela lei e pela sociedade.
                Símbolo máximo desse triste passado é a fogueira, primeiramente utilizada pela Igreja como forma de penalizar hereges e ao mesmo tempo purga-los de seus “pecados”, mas de cuja aplicabilidade o Estado também veio a se servir. Giordano Bruno e Joana D’Arc são exemplos de ícones martirizados em uma sociedade marcada pelo que Durkheim viria a denominar “solidariedade mecânica”. Esta última pode ser entendida como uma forma de organização da consciência social pautada não por motivos naturais – como se concebe a solidariedade orgânica -  mas por dogmas emanados de uma autoridade, quase sempre religiosa, imprescindíveis para a homogeneidade do coletivo.
                Durkheim explica que esse tipo de organização é comum das sociedades primitivas e que nela predomina o Direito Penal. A razão disso está na forma como é tratada a conduta dissonante nessas sociedades: o objetivo é extirpar os indivíduos delituosos em vez de trata-los para reinseri-los no meio social.
                Hoje, o Direito, enquanto ciência, alcança notáveis progressos nesse aspecto, o que confere a nossa sociedade o status de civilização avançada, cuja preocupação está na reciclagem do reu e não na sua eliminação. Ademais, desde meados dos séculos XVIII e XIX que o caminho para a pena cruel e torturante tem sido fortemente rejeitado em diversos países.
                O desafio, entretanto ,está na antítese que a própria sociedade apresenta a esse progresso. O senso comum costuma cobrar punições mais severas e drásticas do aparato jurídico, condena-se os Direitos Humanos, de forma que a Ciência Jurídica acaba sendo uma pequena vanguarda nesse progresso social, guardiã da integridade dos indivíduos que, se entregues ao julgamento da coletividade, certamente seriam medievalmente punidos.
                É de se questionar o que move a grande massa moderna. Teria a solidariedade mecânica realmente sido superada, ou as brasas das fogueiras medievais ainda ardem em nossos dias, reinflamáveis a um simples sopro?




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