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segunda-feira, 27 de julho de 2020

Amor onde? Progresso para quem?

No decorrer do século XIX, o pensamento positivista, idealizado por Augusto Comte, ganhou força, tornando-se socialmente engajado, sobretudo no meio militar. Consequentemente, o movimento republicano no Brasil também se ligou ao militarismo e tinha por finalidade última conduzir a população brasileira ao Progresso, através da formação de um estado nacional-republicano de caráter positivista. 

Foi então que surgiu a necessidade de construir uma identidade brasileira, manifestada, dentre outras ações, na criação da Bandeira Nacional, idealizada pelo belicista Raimundo Teixeira Mendes. Com isso, “Ordem e Progresso” estampou o centro do lábaro estrelado e preconizou a filosofia social adotada no Período Republicano. Evidentemente, o pragmatismo do lema é notório, contudo, incompleto, pois Comte falava em “Amor por princípio, Ordem por base e Progresso por fim”.

Dessa forma, a concepção comtista era de que, nas palavras do próprio autor “O Amor sempre deve ser o princípio de todas as ações individuais e coletivas, enquanto a Ordem consiste na conservação de tudo o que é bom, belo e positivo, bem como o Progresso é a consequência do desenvolvimento e aperfeiçoamento da Ordem”. Ou seja, a moral humana rege o ordenamento social que por sua vez leva ao Progresso geral da nação. Sendo assim, de modo similar, a conduta comum, manifestada na prática cultural, culmina na finalidade principal: o bem estar social. 

Contudo, analisando dessa maneira, o positivismo revela-se estritamente sistemático, já que ignora em sua formulação a origem e o destino dos indivíduos: a ideia era compreender o que a sociedade significava em si mesma, independe de fatores externos. Do mesmo modo, a harmonia social sobrepõem-se ao sujeito, anulando qualquer perspectiva individual de ascensão estamental, assim como anula a vontade particular dessa ascensão. Portanto, o ideal positivista viabiliza a desigualdade em seu cerne, ao considerá-la não só natural, como também fundamental para a melhora do coletivo humano — não por acaso, foi justamente no Período da República Velha em que as desigualdades mais se acirraram no país, segundo a antropóloga Jacqueline Muniz, professora da UFRJ. 

Nesse sentido, o executivo brasileiro encontra-se novamente nas mãos de militares e de positivistas (Bolsonaro e sua equipe “técnica”) — e mais uma vez as disparidades de renda também voltaram a crescer, depois de uma década de melhoras, segundo o IBGE. Entretanto, é importante ressaltar que o positivismo contemporâneo está maquiado, por exemplo, nos ideais do pensador/astrólogo Olavo de Carvalho que, em 1996, escreveu “O imbecil coletivo”, cuja máxima é de que a ordem social é garantida na reprodução humana. Nesse raciocínio, a homossexualidade é vista como um desejo egoísta, que contribui somente ao desestruturamento da Ordem. O indivíduo LGBT é, portanto, passível de punição pela sua condição em si (repare na restritiva normatização do olavismo, semelhante àquela apontada na formulação da sociedade positiva). Em suma, a história do positivismo se confunde com a história do Brasil na medida em que se mescla com o militarismo e resulta no contraditório delírio contemporâneo proposto pelo olavismo. Ao leitor restam duas dúvidas: Aonde foi o Amor do lema? E a quem o Progresso se destina? 

Por Diego Malvasio Bertolino, aluno do 1º ano em Direito Noturno na Universidade Estadual Paulista (Unesp).

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