Na transição do século XVIII para o XIX, surge na sociedade uma
grande ânsia pela sistematização do Direito, afinal esse pode ser concebido
como ciência? Há possibilidade de desvinculá-lo do instinto humano vingativo? Analisando-se
a etimologia da palavra justiça advem do latim justitia, podendo ser compreendido como equidade ou administração
da lei. Como um dos pioneiros da formulação dos alicerces para um estudo cientifico,
destaca-se o positivista inglês John Austin, com suas obras “The province of
Jurisprudence Determined” e “ Lectures on Jurisprudence or the Philosophy of
Positive Law”. Entretanto, definitivamente o ápice dessa sistematização veio na
obra “Teoria Pura do Direito” de Hans Kelsen, focando as normas jurídicas
positivas como o campo de estudo do direito, despreendendo-se totalmente da
subjetividade.
O meio jurídico moderno está enfatizando com veemência o
caráter técnico, com um viés totalmente matemático, desprezando e
desconsiderando aspectos valorativos que podem até mesmo ser relevantes para
uma correta análise de seus fatos. Sob o âmbito da consciência coletiva,
diariamente nos deparamos com discussões a respeito de diversas injustiças e
impunidades (o que em muitos casos infelizmente é a realidade), entretanto os
agentes do Direito não devem e não podem restringir-se somente a esse aspecto
emocional, pois se assim fosse, viveríamos em um quadro de calamidade pública.
Afinal, pautado pela teoria de contrato social de Rousseau, percebemos que
teoricamente abdicamos de nossa liberdade natural polo poder coercitivo do
Esatado, logo cabe ao mesmo o estabelecimento da normatização dos elementos jurídicos que
pautam o sistema punitivo.
Restringindo-se ao âmbito jurídico brasileiro, necessita-se
destacar que vivenciamos o sistema de Civil Law, logo as fontes do Direito
adotadas são puramente a lei e os textos constitucionais, reverberando mais
ainda essa tendência cartesiana. Por outro lado, os países de origem anglo-saxônica
adotam o modelo do Common Law, o qual confere uma maior dinamicidade, por
pautar-se por jurisprudências, ou seja, conjunto de interpretações das normas
do direito proferidas pelo poder judiciário.
Essa aparente matemática jurídica é retrada de modo
sensacionalista no filme “Código de Conduta”, do diretor americano Gary Grey. O
protagonista do filme (Clyde Shelton), após presenciar o assassinato de sua
esposa e filha, recorre a máquina jurídica, entretanto pela escassez de provas
concretas, resulta na amenização da pena de um dos assassinos e a decretação de
pena de morte do outro. Uma interessante observação, é que o diretor propicia
uma cena dramática na hora da morte do prisioneiro por toxinas, o que soergue
uma calorosa discussão a respeito dessa prática, entretanto não cabe aqui essa
abordagem. Clyde decide então, após 10 anos de preparação, vingar-se do
assassino que fora solto pela aparente incompetência do tribunal de justiça, ansiando
que esse fosse infalível, uma mera utopia, apesar da grande perda imaterial, que era sua família.
Sob a ótica durkheniana, percebe-se nitidamente o quanto a
solidariedade mecânica encontra-se enraizada na nossa sociedade, tanto que se
traduzirmos o título original, chega-se a um “Um cidadão exemplar”. O diretor
almeja justamente instigar os telespectadores a uma análise a respeito da
justiça, afinal alguma justiça é melhor que nenhuma? É extremamente complexo a
quantificação da justiça, pois o estabelecimento de modelos pode resultar em
inevitáveis injustiças, colocando em cheque a própria solidariedade orgânica,
tão aclamada pela sociedade dita como moderna.
Uma observação pertinente é se essa racionalidade é
aparentemente inviável, a passionalidade seria útil? Obiviamente que elementos
subjetivos também resultariam em injustiças e sentenças proferidas de modo
insensato. Portanto, uma linha tênue deve ser traçada entre ambos
elementos, soerguendo-se como uma dúvida para as sociedades futuras e
estabelecimento de meios jurídicos mais eficientes, agora quanto ao modo, ainda é
um amplo mistério, seria Deus um bom intermediador? Novamente retornamos ao
ciclo vicioso, logo uma aparente dúvida eterna.
Nenhum comentário:
Postar um comentário