O filme brasileiro Madame Satã, de 2002, dirigido por Karim Ainouz, retrata a vida de João Francisco dos Santos, um homem pobre, negro e gay, e, de acordo com uma ficha policial retratada na primeira cena do filme, “sujeito de pouca inteligência”.
É possível perceber nessa obra cinematográfica que João não é apresentado como um “anormal” ou como um “desviado”, já que não é comparado a uma bicha histérica, feminina e fragilizada, que é como os indivíduos mais intolerantes acerca da opção sexual imaginam um homem gay. Muito pelo contrario, durante o longa, o personagem principal aparece defendendo seus amigos que moram com ele, mostrando seu lado masculino apesar de sua opção sexual.
Por apresentar personalidade forte, o personagem encontra problemas durante a tentativa de se inserir na sociedade, pois queria sempre fazer parte e além disso, entrar pela porta da frente. A ausência de um clímax conclusivo, e o fato de o personagem despertar mais sentimentos de simpatia e admiração do que de pena ou compaixão fazem com que Madame Satã não busque a cumplicidade pela lágrima fácil, e sim pela reflexão.
Hodiernamente, é possível notar a mesma dificuldade de inserção de indivíduos negros e homossexuais na sociedade. Na Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão 26, o Deputado Federal Roberto João Pereira Freire alega que a homofobia e a transfobia constituem espécies do gênero racismo e, além disso, se enquadram no conceito de discriminação atentatória a direitos e liberdades fundamentais. Ele assegura ainda que a segurança é um direito fundamental de todos os indivíduos.
Primeiramente é necessário notar a importância da mobilização do direito dos indivíduos homossexuais e transexuais, que, através de sua luta e de seu reconhecimento próprio de obter certos direitos que são fundamentais na vida de qualquer indivíduo. No entanto, é necessário afirmar que só há essa luta se houver criminalização da homofobia, porque esse grupo social sofre ofensas, homicídios, agressões, ameaças e discriminações motivadas pela orientação social e/ou identidade de gênero, real ou suposta. De acordo com o artigo 5º, XLII, “a prática do racismo constitui crime inafiançável e imprescritível, sujeito à pena de reclusão, nos termos da lei;” e, segundo o artigo 5º, XLI,” a lei punirá qualquer discriminação atentatória dos direitos e liberdades fundamentais;”. Desse modo, pode-se perceber que os indivíduos que sofrem com a homofobia diariamente são discriminados e, de acordo com a Constituição Federal de 1988, os indivíduos homofóbicos deverão ser punidos.
De acordo com Michael McCann, professor de “Avanço da Cidadania”, na Universidade de Washington, a mobilização do direito é uma forma de lutar para a democratização da sociedade, assim como é necessário que os Tribunais ajam para que a desigualdade de direitos não ocorram, os grupos discriminados devem lutar para que seus direitos fundamentais sejam respeitados. Dessa forma, além de refletirmos sobre a mensagem que é transmitida pelo filme brasileiro, é necessário que a sociedade e o direito atuem para a atenuação dessa séria problemática que é o preconceito.
Julia Pontelli Capaldi, turma XXXVI de Direito noturno.
Nenhum comentário:
Postar um comentário