Desde o século XXI, vive-se o apogeu do neoliberalismo na
sociedade e dentro desse contexto, frente a consolidação cada vez mais inegável
do capitalismo no mundo, ocorre um acentuamento do recuo estatal, na medida em
que as proteções às minorias são cortadas em favor das grandes empresas. Para o
sociólogo Boaventura de Souza Santos, isso teria como um consequência um
''fascismo social'' e o aumento da desigualdade. Ademais, reflete o autor se o
Direito seria capaz de se opor a esse fenômeno efetivando as conquistas sociais
dos ''99%'' da população contra os hegemônicos ''1%'', os quais mobilizam o
Poder Judiciário em favor de seus interesses. Têm-se, por conseguinte, como
exemplo de reflexo dessa luta, a candidatura para vice-presidente de Sônia
Guajajara (PSOL), uma representante emblemática dos povos originários (por
vezes apagados no meio social, embora contemplados pelo ordenamento jurídico) e
da busca por um desenvolvimento mais sustentável. Nesse sentido, abrangendo o
caso dela e de muitos outros, poderá ser o Direito entendido como emancipatório
dentro da atual conjuntura sociopolítica?
Com o advento da nova Constituição Federal em 1988, os
direitos dos povos originários foram finalmente reconhecidos, tendo sua
expressão máxima na demarcação de terras e a criação de órgãos e legislações próprias
para a regulamentação da questão indígena. No entanto, essas conquistas nunca
foram implementadas na prática, uma vez que a atual conjuntura sociopolítica
brasileira privilegia os detentores de poder e impede que a Carta Magna atinja
sua função social. Antes do processo colonizatório, o território brasileiro era
ocupado pelas mais diversas tribos indígenas. Hoje, depois do extermínio das
comunidades originárias, somente 13% do território é classificado como
pertencentes aos indígenas. O agronegócio, a pecuária, os grandes fazendeiros e
a economia determinam o direito e o tornam cada vez mais restrito.
Vale ressaltar, como a pré-candidata à vice-presidência bem
exemplificou, que, na concepção indígena, o direito territorial é um direito
originário, mas há indivíduos com poderes sociais e políticos maiores que não
se interessam e/ou são contrários a essa afirmação. Dessa forma, os direito dos
indígenas foram difíceis de serem conquistados, sendo que todos foram obtidos
através de muita luta e de também, muita coragem, afinal, como a mesma
informou, o Brasil é um dos países que mais matam ativistas no mundo. Dentro
dessa perspectiva, se torna nítido que, quando o Direito passa a dar ouvidos à
luta e à voz dessa população excluída politicamente e socialmente, há a
formação de um direito reconfigurativo e este tem a importante função de
afirmar o protecionismo e garantir todos os direitos estabelecidos na
Constituição Federal. Esse Direito reconfigurativo deve proteger a população
excluída das ações sociopolíticas, nesse caso os indígenas, deixando de
incorporar apenas as opiniões dos mais favorecidos.
Tendo em vista essa conjuntura sociopolítica excludente, a
partir da análise de Boaventura de Souza Santos, há o entendimento de que o
Direito sozinho não há como ser emancipatório, posto que, diversas lutas
sociais são impossibilitadas apenas pelo uso do direito ou política, há a
necessidade de uma junção de ambas as áreas de atuação, para que seja possível
a formação de uma nova hermenêutica, tendo a judicialização como possível
caminho a ser seguido. De acordo com o sociólogo, há a necessidade de uma
efetiva ocupação dos espaços, baseada nos princípios constitucionais,
determinada Constituição que é abordada diversas vezes por Sônia Guajajara em
seus discursos, como sendo a representação da vontade democrática, por isso,
considerada Constituição Cidadã. Sendo assim, há a possibilidade do Direito ser
emancipatório desde que parta de princípios constitucionais a fim de
transformar o sistema judiciário e político, representando a população
excluída, na atualidade, de forma social e política.
Destarte, é indubitável a importância de reconfigurar o
Direito, transformando as leis e a política de forma a contemplar as
necessidades dos povos representados pela pré-candidata Sônia Guajajara, cujos
direitos fundamentais foram apenas recentemente garantidos constitucionalmente
e ainda não se concretizaram efetivamente na prática. Ocorrendo essa
mobilização, possibilitaria que as lutas sociais tivessem mais visibilidade,
facilitando o alcance de seus objetivos primordiais e, assim, evitando o que
Boaventura de Souza Santos definiu como “fascismo social”, já que haveria um
decréscimo no nível de desigualdade entre a população. Logo, percebe-se a
importância de mover esforços, como a própria judicialização, a fim de
contribuir com a materialização de um caráter emancipatório do Direito.
Diurno - Ariadine Batista; Isadora Semedo; Jéssica Modolo; Lívia Goto; Valkíria Nóbrega
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