Poder Simbólico e a Imposição da Não Escolha
O conceito de campo, na obra de Pierre Bourdieu, refere-se às estruturas e relações específicas de poder e dominação, isso é, os recursos que formam seu capital simbólico. Além disso, essas relações juntamente com as sociais acarretam o permanente enfrentamento sobre o direito de dizer o direito, ou seja, a tentativa de sobrepor a interpretação própria sobre a do outro. Esse conflito se reflete em diversas questões na coletividade, como nas discussões sobre o aborto de anencéfalos.
Os adversos a essa antecipação terapêutica argumentam sobre o direito à vida, previsto no artigo 5º da Constituição Federal. Entretanto, na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) de número 54, o Doutor Luís Roberto Barroso buscou demonstrar que esse tipo de antecipação não constitui aborto, uma vez que esse envolve a vida extrauterina em potencial, acresce também que, por conseguinte, os operadores da saúde, ao realizar esse procedimento, não deveriam sofrer ação pena pública, tendo considerado o tipo de aborto. Sendo assim, nessa visão, interpretar essa operação de antecipação pelos artigos 124, 126 e 128 do Código Penal mostra-se inconstitucional, uma vez que não se tipifica aborto de fato, já que não há perspectiva de vida do feto.
Outrossim, a corrente que defende o poder de escolha da mulher grávida alega a violência simbólica, como dito por Bourdieu, que essa sofre. Dessa forma, assim como dito na própria ADPF, a imposição de a mulher carregar por nove meses um feto, que se tem conhecimento de sua não sobrevivência, causa danos morais a ela, além de ferir seu direito fundamental de dignidade e cerceio à liberdade e autonomia da vontade, além dos riscos à saúde, tanto física quanto mental e social. Nesses casos, por exemplo, uma simples pergunta de: “qual será o nome do bebê?” pode causar um dano e uma dor demasiada. Logo, nota-se a imposição de uma escolha pelo poder simbólico, não permitindo que a mulher exprima sua vontade.
Mediante o exposto, aufere-se ser mister a promoção do direito de escolha sobre realizar ou não a antecipação terapêutica, além de fornecer uma segurança jurídica aos profissionais da saúde. Desse modo, estando o Direito em um campo de ilusão sobre ser independente das forças externas, cabe à ele em consonância com os órgãos dirigentes da Medicina regulamentar essa ação. Para assim, por veredicto, isso é, o produto dessa luta simbólica, facultar essa decisão a carregadora do feto e, sendo assim, assegurar a essa seus direitos fundamentais integrados na Constituição.
Direito - Noturno
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