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segunda-feira, 5 de dezembro de 2022

ADI 6.987 e a luta pela verdadeira democracia no Brasil

   A Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) n 6.987, de 2020, foi levada ao Supremo Tribunal Federal (STF) pelo partido Cidadania, com a finalidade de reconhecer-se, ao menos num campo jurídico abstrato, a injúria racial enquanto racismo, de modo a não gerar diferenças entre essas duas concepções, pelo menos no momento de determinar sentenças. 

   A esse ato, pode-se entender o que propõem os teóricos Antoine Garapon e Pierre Bourdieu, a respeito da figura do judiciário na luta por uma (ao menos teórica) expansão da efetivação da democracia em territórios brasileiros. Isso porque, quando se pensa no contexto contemporâneo, se percebe que, cada vez mais, existe uma movimentação para o enraizamento da democracia, sobretudo pela movimentação dos indivíduos e grupos sociais historicamente marginalizados, levando aos tribunais questões antes ignoradas, como no caso citado (equiparação entre a injúria racial e o crime de racismo), numa tentativa de se buscar um Direito anti formalista e anti instrumentalista, isto é, que não seja indiferente das pressões sociais, nem que sirva apenas as classes dominantes.

   Ainda nessa questão, Michael McCann traz uma complementação a respeito da luta da comunidade negra, e que já se entende por mais de um século, para mobilização dos meios jurídicos em prol de uma proteção a questões básicas de sua existência, mas que nem por isso deixaram de ser constantemente desrespeitadas; ao se afirmar que um ato de injúria seria algo "apenas" direcionado ao indivíduo em si, e não ao grupo ao qual ele faz parte, se está desconsiderando toda a luta que estes indivíduos tiveram para que fossem tratados de forma semelhante aos demais, uma vez que a base de violência aqui é a própria origem étnica-racial do mesmo, de modo que, quando se busca a ofensa ( base da injúria), se utiliza disso.

   Outro ponto a ser observado é a questão tratada por Sara Araújo, onde, numa nação fundada em uma clara visão cultural da classe dominadora e opressiva (branca elitista), não houve, e mesmo hoje, pouco há espaço para as demais culturas e suas manifestações, assim como para a sua posição quanto aos ataques sofridos; na lógica em questão, a cultura dominante é a "certa", enquanto as demais, "erradas". Assim sendo, cria-se um contexto onde a ideia de se separar um ato de violência baseado na origem do indivíduo de outro, supostamente atrelado a algo mais "coletivo ", como se isso fosse possível, é "razoável", como que se dizendo que " a injúria racial é um ódio ao indivíduo, enquanto o racismo, ao grupo". 

   Complementando essa ideia, há o que o autor Achille Mbembe traz a respeito da relação do Direito e do indivíduo dominante (branco). Em sua obra, ele aponta para o fato de que o sistema judicial foi criado em bases da classe dominante, se adequando apenas aos seus direitos e às suas preocupações; não há, no modelo básico do Direito , a real amplitude necessária para abranger todos os indivíduos que sejam membros do Estado brasileiro, pois foi sempre pensado para satisfazer interesses de uma classe majoritariamente homogênea quanto às suas origens, e, portanto, incluindo muitas questões que prejudicam os grupos sociais mais marginalizados, como no caso em questão. 

   Dessa forma, conclui-se que a Ação em questão é mais que necessária; é fundamental para a democracia brasileira, enquanto empenhada em buscar oferecer a todos o máximo de proteção possível, lutar por questões como esta, que não deixa de ser uma prova de quão arcaicos e problemáticos são os alicerces da sociedade brasileira 


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