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terça-feira, 17 de maio de 2022

O funcionalismo e a importância de um cenário educacional brasileiro mais diverso

 

            Criada no século XIX, a partir das concepções do sociólogo Émile Durkheim, a teoria funcionalista influenciou fortemente o desenvolvimento das ciências sociais, sobretudo nos campos da sociologia, antropologia e psicologia. Tal teoria compreende a sociedade como uma rede de referências sociais, buscando definir e encontrar a casualidade eficiente – a função – de cada fato social inerente a uma comunidade. Apesar da ampla passagem de tempo desde a época da sua criação, as noções desenvolvidas por Durkheim ainda apresentam grande relevância na contemporaneidade e podem contribuir para um melhor entendimento dos fenômenos sociais presentes nas sociedades hodiernas e, consequentemente, para a melhora elaboração de políticas públicas que abordem tais fenômenos.

            Uma das principais críticas abordadas pelo funcionalismo é quanto ao metódo adotado pelas ciências sociais em suas pesquisas. Durkheim criticava assiduamente a tendência de tais estudos de manterem-se presos ao campo das concepções ideológicas, afirmando a necessidade de se entrar em contato, de se testemunhar a realidade a qual se estuda investigar. A defesa do pensador da pesquisa social empírica repercutiu fortemente nas matérias sociais, especialmente no campo antropológico, servindo com um marco de destaque da importância que a realidade inflige sobre as teorias. Tal concepção pode ser extrapolada para o campo jurídico, que abrange, de certa forma, essa dualidade entre a realidade e a abstracidade.

             As normas jurídicas são conteúdos de natureza teórica que buscam tocar o que é real. Apesar de muitas delas carregarem em si a essência do dever-se, isto é, uma esperança intrínseca por uma realidade melhor, uma perspectiva futura, ainda assim, elas são aplicadas e afetam e são afetadas diretamente pelos fenômenos sociais concretos do presente. Tendo isso em vista, não é de se estranhar que, muitas vezes, as leis e a realidade social sofram desencontros conceituais. Muitas vezes, as leis falham em representar as sociedades que tocam, por, como aponta Durkheim, por não compreenderem os fatores concretos ou as transformações pelas quais estes passaram, seja por disparidades temporais, seja porque aqueles que elaboram tais leis não entenderem os impactos de determinados fatos sociais, por nunca terem tido que experimentá-los.

            Pode-se observar a presença destes embates, por exemplo, nas questões que giram em torno da constitucionalidade das leis de cotas raciais às universidades brasileiras. A instituição das cotas raciais colocou em xeque no judiciário nacional a ideia de igualdade, prevista pela Constituição vigente, um conceito abstrato, porém, que deve ser inserido diretamente na sociedade a ponto de ser incorporado, se ainda não o é, como um fato social. Dito isso, temos um claro exemplo de como a realidade influenciou a mudança de um conceito ideológico à medida que a declaração da constitucionalidade da Lei de Cotas demonstrou que a igualdade prevista no texto normativo, aquela que garante que todos serão tratados de maneira igual perante a lei, não pode se concretizar sem uma igualdade real, ou seja, sem que todos os indivíduos possuam condições iguais de acesso a lei e aos seus direitos dentro da sociedade, um objetivo que só pode ser alcançado a partir da tomada de medidas concretas, que alterem os meios materiais da sociedade.

            E foi isso que a Lei de Cotas fez. Ela garantiu que estudantes historicamente marginalizados pela sua cor de pele e que, portanto, não receberam as mesmas condições de estudo que outros que não sofrem tal marginalização, sejam equiparados a estes no processo seletivo dos vestibulares, estendendo a eles o direito de acesso à educação. É importante notar que a elaboração desta norma teórica, com base em parâmetros empíricos de observação da realidade atual do país, por si contribui para alterar toda uma dinâmica de fatos sociais dentro da nação brasileira. Como afirma Durkheium, a educação possui a incumbência de forjar o ser social, isto é, lhe incutir regrar que, aos poucos, são interiorizadas, tornando-se naturalizadas pelos indivíduos. É por meio da educação que cada um começa a desenvolver suas visões de mundo e seus comportamentos de interação social. Sendo assim, ao incentivar a construção de ambientes escolares mais diversos, a Lei de Cotas Raciais contribuí para a formação de cidadãos mais conscienciatizados sobre a as diferentes realidades incluídas na realidade que os cerca, levando a deterioração, ainda que lenta, do racismo no seio social brasileiro.

            Desta forma, nota-se como a compreensão da realidade é um fator importantíssimo para a elaboração de políticas e estudos sociais, uma ideia proposta pela corrente funcionalista, que, além de elevar a consideração que se atribui ao concreto, também ressaltou um valor intrínseco à humanidade, mas, muitas vezes, facilmente esquecível nos tempos atuais de competições acirradas e individualismo exarcerbado: a noção de que todos estão interligados e que, por isso, aquilo que afeta ao outro, consequentemente, afetará a todos, direta ou indiretamente, rápido ou vagarosamente. Durkheim lembrou ao mundo, de maneira intencional ou não, dos laços de solidariedade que unem e mantém o conjunto social. E esta talvez tenha sido a sua contribuição mais essencial para a compreensão e o sentimento do humano.


Nome: Isabela Maria Valente Capato

R.A: 221221468

Período: diurno

Disciplina: Sociologia do Direito 

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