Max Weber, em sua obra A ética protestante e o espírito do capitalismo, em especial no segundo capítulo, discorre a respeito da evolução deste sistema ao longo do tempo. De início, faz a seguinte observação: o impulso de ganhar dinheiro – a auri sacra fames – não é exclusivo do capitalismo, uma vez que existia em tempos remotos (como exemplo, Judas Iscariotes ‘vendeu’ informações sobre Jesus por algumas moedas, ou então, como o próprio autor exemplifica: médicos, apostadores, mendigos possuem tal vontade). Nem mesmo a troca ou o comércio são caracterizadores dele, mas o espírito do capitalismo liga-se à ideia de racionalização, ou seja, à dinamização racional do investimento utilizada de modo a obter maior lucro, a enriquecer. Como base para essa afirmação, Weber cita alguns fatores que confirmam esse ponto de vista: a separação dos bens da empresa em relação aos bens do indivíduo; o impulso dado a ciências e técnicas revertidas na aplicação prática; a estrutura do direito como ferramenta a dar segurança às atividades capitalistas, além da disposição do homem em adotar essa conduta.
Em convergência a esse fato, Max destaca a reforma protestante, a qual, segundo ele, teria sido o ponto chave para essa racionalização: influenciando ainda mais a vida dos seguidores, tornou o acumular com o fim em si mesmo sinônimo de virtude e eficiência. Essa nova ‘ética’, por conseguinte, teria sofrido um embate, uma resistência de um tradicionalismo, associado à doutrina católica, que veria essa conduta como desonesta, um desvio de caráter. Dessa forma, relata: “O católico é mais quieto, tem menor impulso aquisitivo, prefere uma vida a mais segura possível, mesmo tendo menores rendimentos, a uma vida mais excitante e cheia de riscos, mesmo que esta possa lhe propiciar a oportunidade de ganhar honrarias e riquezas. Diz o provérbio ‘coma ou durma bem’. Neste caso, o protestante prefere comer bem, e o católico, dormir sossegado” (WEBER, Max. pg 23). Assim, para o autor, o católico seria acomodado com sua situação, e o protestante preocupado simplesmente com o seu enriquecimento.
Diante disso, coloco-me contrário à posição de Weber. Primeiramente, informo que se a Igreja fora contrária a princípios capitalistas, como a usura, isso decorre da cautela que tem para que se evite que o avanço se sobreponha ao ser humano. Ou seja, impedir que o homem seja despido de sua dignidade. Com a consolidação do capitalismo e por vivermos nesse sistema, por sua vez, observa-se então que tal lucro é necessário, não há como o negar. Ademais, é extremamente saudável ao homem trabalhar, garantir seu sustento e realizar-se no que faz. Isso não quer dizer que deve acomodar-se em sua situação, adotando a lei do mínimo esforço para viver sossegado. Pelo contrário, deve ocupar sua função exercendo o melhor de si, podendo almejar uma melhor condição de vida, enriquecendo, sem ferir os demais. Além disso, se não aceitasse riscos, não se doaria a missões (cuidado a aidéticos na África, por exemplo), à preocupação com o próximo, as quais não possuem nem fins lucrativos.
Quanto a esse último exemplo, devo mencionar inclusive as missões evangélicas que possuem objetivos muito semelhantes. Nisso, portanto, outro ponto questionável é a afirmação de que protestantes focam-se no enriquecimento em si, quando na verdade, o que se vê não corresponde a tal fato: há preocupação com uma formação ética (presente, por exemplo, no âmbito universitário), aplicação e defesa de valores do cristianismo em diversas áreas como na política, na educação, no dia-a-dia.
Divergindo dos aspectos que apresentei, no entanto, há indivíduos que se denominam cristãos mas que, na verdade, defendem uma espécie de “prosperidade” monetária como valor fundamental. Munidos de um discurso convincente, manipulam fieis a doarem seus bens e, por fim, apropriam-se das doações: destinam-nas a empresas, construção de mansões, aquisição de bens próprios. Tal fato sim, caracteriza um domínio da fé por uma razão baseada em interesses capitalistas, de modo frio e calculista, o que não se compactua com nenhum valor cristão.
Dessa maneira, não se trata da combinação de fé e razão, que leva a um equilíbrio do ser (como disse o saudoso João Paulo II, a fé sem a razão é cega, a razão sem fé leva ao caos); mas na irracionalidade de se colocar ‘pedágios’ interesseiros no caminho do fiel, fato que tanto o catolicismo, quanto o protestantismo consideram lamentável.
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