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sábado, 26 de junho de 2021

Conhecimento e perspectivas

    Em 2022 irá ocorrer a revisão da lei de cotas brasileiras. Tal fato reacende a discussão acerca do assunto e instiga a análise das consequências dela em nossa sociedade.

    Sob uma perspectiva histórica, o reconhecimento da população negra como seres humanos ainda é recente no país. Em tese, o fim da escravidão deu-se há apenas 133 anos atrás e por fins econômicos, não humanitários. A sociedade brasileira foi construída e baseada em um ambiente extremamente desigual e racista. Por esse motivo, a meritocracia é apenas uma idealização, visto que não há oportunidades e possibilidades comuns a todos. 

    A problemática imposta por essas desigualdades dá origem à necessidade da implementação de políticas públicas equitativas com o objetivo de oferecer oportunidades minimamente igualitárias dentro do ambiente universitário. A lei de cotas rearranja o cenário acadêmico em uma tentativa de corrigir as distorções criadas por fatores diversos da sociedade e inserir dentro desse ambiente elitizado e branco as populações desfavorecidas pelo sistema.

    As consequências da adoção da lei de cotas são muitas e entre elas está a diversificação na construção de conhecimento. Um dos princípios de uma universidade é produzir conhecimento e torná-lo acessível e benéfico à população. A ciência moderna tem como sua principal base a defesa do conhecimento como ferramenta de transformação do mundo. Assim, democratizar o acesso de todos à universidade é também possibilitar uma profunda mudança nas estruturas sociais.

    Quando, dentro de uma universidade, há diferentes vivências, reflexões e observações, há também o rompimento com a padronização da construção de conhecimento e de impacto na comunidade. Francis Bacon compreende que as idéias advém dos sentidos e, assim, as perspectivas humanas acerca do mundo são baseadas nas experiências que cada um adquiriu durante a vida. Assumindo essa premissa, os indivíduos criam relações importantes para o aprimoramento da vida coletiva a partir do choque de visualizações do mundo.

    Ainda sob a ótica da ciência moderna, René Descartes, em sua obra “O Discurso do Método”, cita a importância de conhecer as relações sociais e culturais para entender a forma como uma sociedade se constrói e, dessa maneira, interpretar de fato uma realidade.  Compreende-se, portanto, que é preciso embasamento concreto para intervir em uma realidade de maneira efetiva. 

    Diante disso, novamente ressalta-se a necessidade de inclusão de pessoas de diferentes vivências dentro dos meios acadêmicos e científicos, principalmente aquelas que muitas vezes não são representadas de forma coerente com suas realidades dentro dos grandes centros de discussão - como as populações afrodescendentes, indígenas e de baixa renda. A inserção de pessoas menos privilegiadas muda drasticamente o cenário social brasileiro, tornando-o mais humano e democrático. Ademais, a integração dessas populações corroboram para a fabricação de ideias que possam, de fato, intervir nas camadas mais distintas da sociedade utilizando-se das diversidades de informações, perspectivas e abordagens que cada indivíduo traz consigo.

    Portanto, frente às disparidades históricas, sociais e estruturais apresentadas pelo sistema brasileiro, a não legitimidade das políticas públicas equitativas não seria possível. Apenas uma realidade não racista, não elitizada e verdadeiramente meritocrática possibilitaria a vedação da lei de cotas. Enquanto o racismo e a exclusão social persistir nesse país, as políticas de ação afirmativa serão necessárias e essenciais para a construção de uma sociedade mais democrática e representativa.

Luísa Sasaki - Direito Diurno - Turma XXXVIII


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