O conceito de “hábitus” desenvolvido por Pierre Bourdieu
corresponde a predisposição de culturas que influenciam nas escolhas dos indivíduos
quando em sociedade, uma vez que representa capitais simbólicos incorporados ao
decorrer da vida de maneira espontânea ao se inter-relacionar com diversos campos
sociais. Assim é possível dizer que o meio no qual um sujeito está inserido
interfere em suas ações, visto que seu consciente foi moldado por certos
capitais simbólicos que influenciam a visão de mundo de cada um.
A partir desses conceitos, é passível de análise o caso de apologia
ao estupro em trote da UNIFRAN, no qual o ex-aluno de medicina- Matheus Gabriel
Braia- proferiu um enojável discurso, entoando falas extremamente machistas para
que as calouras repetissem essas falas nas quais se comprometiam aos desejos
sexuais de seus veteranos. Por mais misógino, machista, e digno de repulsa que
seja essa ação, o que mais é incomodo é o fato de que a juíza responsável pelo
caso tenha se mantido a favor do acusado, alegando que as barbaridades
proferidas na verdade possuíam carga cômica em um contexto descontraído, além de
diminuir a luta feminista, pondo-a como muito rigorosa e que seu caráter sexual
desconceituou a causa original.
Em meio a tamanha balbúrdia, a filosofia e sociologia de
Bourdieu aparecem como caminho para se entender as causas que dizem respeito ao
campo jurídico, no qual o autor afirma a impossibilidade de haver independência
plena do Direito para com as forças externas, uma vez que todos os indivíduos
possuem seus próprios capitais simbólicos engendrados em seus âmagos, fazendo
com que qualquer decisão esteja imbuída de certa subjetividade. Portanto, no
caso em questão, o ex-aluno, se sentia confortável no contexto onde estava inserido,
assim, demonstrou um comportamento preconceituoso por acreditar em sua
impunidade, que foi confirmada pela juíza, que compartilhava, provavelmente, de
um mesmo ou semelhante "hábitus".
Sendo assim, o ideal de racionalização do Direito de
autonomia, neutralidade e universalidade mostra-se inviável em um contexto de
capitais simbólicos de tamanha influência para com as decisões mais
importantes. Nesse sentido, entoar injurias machistas, quer seja em um contexto
descontraído ou não, é algo que reflete toda a complexidade de “hábitus” que engendram
os indivíduos, mantendo preconceitos ignóbeis ainda latentes nas sociedades
hodiernas.
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