De início, o capital simbólico, conceito
difundido pelo sociólogo francês Pierre Bourdieu, abrange a ideia de que o
capital provedor de desigualdades não só
se materializa através de dinheiro e bens materiais, perspectiva comumente mais difundida dentro da literatura
científica . Há dentro do meio social, recursos de outra natureza, que permitem os
indivíduos ocuparem posições de distinção dentro de diferentes campos. Este
capital simbólico, denominado assim por Bourdieu, auxilia na perpetuação de disparidades. Deste modo,
indivíduos se diferem de outros não só pelo poder econômico e relação de
dualidade proletário-burguês de obtenção ou não dos meios de produção, mas também pelas relações
interpessoais que facilitam acessos à recursos de poder( capital social), conhecimento adquirido por meio de educação
formal (capital cultural) e outros. Tais expressões e junções do capital
simbólico fomentam um poder simbólico, que define a capacidade de exercício do
domínio e imposição de uma perspectiva de mundo social conforme interesses de elites
com maior acúmulo de capital simbólico. Assim, no contexto brasileiro, o
capital simbólico é fator presente para aqueles enquadrados como homens brancos
heterossexuais. Por mais que a Constituição cidadã de 1988, dentro de seus
espaço dos possíveis represente marco importante para a obtenção de
prerrogativas a todos os brasileiros e brasileiras , há de se considerar que
existem forças estruturais simbólicas históricas que dificultam o acesso à
justiça , principalmente a grupos minoritários que contradizem ideias e poderes
já difundidos em um meio social desigual, em que relações de poder permanecem
de séculos. Desta maneira, como é possível alterar minimamente tal panorama?
Em primeiro plano, uma atuação proativa
contramajoritária do poder judiciário
pode fomentar mudança. Importante dizer que tal forma de atuação não se trata da perspectiva trazida por Ingeborg Maus, onde
a justiça configura-se como a mais alta instância moral, superego da sociedade,
paternalismo judicial que causa dependência , mas sim da magistratura do sujeito,
conceito de Antonie Garapon. Aqui, para Garapon, a justiça tem a função de
apaziguar o molestar do indivíduo sofredor moderno, amparando este sujeito no
alcance de direitos, permitindo consubstancialização de toda a dignidade democrática
que o sujeito constitucional tem, ou em tese, deveria ter. Desta maneira, o
poder judiciário, se justifica como instância possível de enfrentamento à relações
de poder permeadas pelo capital simbólico. Exemplo claro de tal ideia, é a Ação Direta de Inconstitucionalidade por
Omissão(ADO) 26, que criminalizou a homofobia. A justiça, contrariando o
conservadorismo presente nas elites dominantes, detentoras de capital simbólico,
e até mesmo figuras representes destas nos outros poderes, tornou possível de
penalização condutas ofensivas à homossexuais. Tal ação não se caracteriza como
ativismo judicial, invasão de poderes, mas simples garantia de prerrogativas a
grupos marginalizados por opções sexuais distintas daqueles que possuem poder simbólico.
Em segundo plano, tal atuação do judiciário,
na maioria das vezes, não é algo isolado, tendo influência de outros atores.
Surge aqui, a mobilização do direito, definida por Michael W. McCann, como
ações de indivíduos, grupos ou organizações em busca da realização de seus
interesses e valores. Desta maneira, movimentos sociais, ONG´S, partidos
políticos, pressionam os poderes para
conseguirem que necessidades ou desejos sejam traduzidos em uma reinvindicação
de lei ou afirmação de direitos legais. Nota-se, por exemplo, na ADO 26, que a
mobilização da população homossexual diretamente afetada ou de outros atores próximos, por meio de
manifestações e outras ações, permite enfoque de partidos políticos progressistas ligados à causa , acionando o judiciário para materialização do direito ou criação de
medidas que evitem danos.
Em
síntese, nota-se que a atuação proativa do judiciário e a mobilização do
direito fazem parte de um mesmo sistema de reinvindicações. A judicialização da
política, deste modo, é uma consequência da mobilização .Tais mecanismos são
formas conjuntas legítimas de enfrentar
elites detentoras de capital simbólico.
João Felipe Schiabel Geraldini. 1ano. Direito Noturno.
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